quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A CAPOEIRA: da perspectiva identitária e territorial sociocultural do séc. XIX, ao vestuário esportivo de discurso sociocultural no séc. XX

 A Capoeira: da perspectiva identitária e territorial sócio cultural do séc. XIX ao vestuário esportivo de discurso sócio cultural no séc. XX
Gil Cavalcanti de Albuquerque(Mestre Gil Velho/ 2009
Texto publicado no SITE do Memorial da Capoeira Pernambucana

Capoeira de Movimento Sócio Cultural do Século XIX
Para fazermos uma análise sobre esta questão, temos que voltar no tempo e analisar o contexto da realidade sócio-cultural, de espaços contemplados com a existência de registros identitários e territorial da capoeira.
Dentro deste olhar, surgem dois espaços capoeiras: o das cidades de Recife e Rio de Janeiro.

Estes dois nichos urbanos eram, neste período, os dois maiores pontos de comunicação com o restante do mundo. Ou seja, eram os centros de maior circularidade, no Brasil, no século XIX, de pessoas, idéias, comércio, etc. E, este ponto de interação era a zona portuária. Os portos, neste período, eram a conexão com o global, ou seja, eles eram os pontos                                                        que estavam conectados com a perspectiva globalizante. Comunicavam-se e trocavam idéias com nichos sócio-culturais semelhantes e diversos.
No século XIX, diversos movimentos conectados com este universo portuários apresentaram formas de organização identitária e territoriais semelhantes: as gangues de rua. Podemos enquadrar, aí, além das maltas de capoeira carioca, e dos malandros (descendentes das desbaratadas maltas); os fadistas de Lisboa e do Porto, com suas guitarras e o temido Santo-Cristo (a grande navalha de ponta); os malandrins de Paris, com os golpes de mão e pé do savate, e com a técnica da cane (bengala que escondia, muitas vezes, uma lâmina ou estoque); as gangues de irlandeses e “nativos” de Nova Iorque, tão bem representadas por Martin Scorsese no seu filme The Gangs of New York; as revoltas dos boxers nos domínios ingleses do oriente, entre outros.
Estes movimentos sociais anárquicos, leia-se, que construíam sua realidade a partir do indivíduo, através da desconstrução do estabelecido, se comunicaram entre si, tendo como ponto de conexão, na época, o porto. Porém, o porto teria que ter algo que produzisse sua conectividade, ou seja, o motivo desta relação interacional: sua força de espaço sócio-econômico.
O Rio de Janeiro ao se tornar a capital do reino português, produziu a abertura de seu porto e a emergência de uma diversidade de fatores que tinham ficado adormecidos durante toda sua existência colonial.

Em Recife, o espaço brasileiro que, desde seu início, foi o lugar mais brasileiro do Brasil, surgiu, de fato, a perspectiva libertária e revolucionária brasileira. Recife sempre representou, para Portugal, o lado anárquico brasileiro, com as suas insurreições que minaram o absolutismo Português. Como a revolução de 1817, que em dois meses fez um ensaio de uma nova nação e provocou a partir daí, cinco anos depois, a ruptura (a independência do Brasil ) com Portugal.

No século XIX, com a vinda da Corte Portuguesa, se dá o rompimento com o Brasil colonial. Gilberto Freire, em Sobrados e Mucambos, fala: A valorização social começara a fazer-se em volta de outros elementos: em torno da Europa, mas uma Europa burguesa, donde nos foram chegando novos estilos de vida, contrários aos rurais e mesmo patriarcais: o chá, o governo de gabinete, a cerveja inglesa, a botina Clark, o biscoito de lata. Também roupa de homem menos colorida e mais cinzenta; maior gosto pelo teatro que foi substituindo a igreja; pela carruagem de quatro rodas que foi substituindo o cavalo ou o palanquim; pela bengala e pelo chapéu-de-sol que foram substituindo a espada de capitão ou de sargento-mor dos antigos senhoras rurais. E todos esses novos valores foram tornando-se as insígnias de mando de uma nova aristocracia: a dos sobrados. De uma nova nobreza: a dos doutores e bacharéis talvez mais que a dos negociantes ou industriais. De uma nova casta: a de senhores de escravos e mesmo de terras, excessivamente sofisticados para tolerarem a vida rural na sua pureza rude.

Naturalmente que o fato determinou mudanças drásticas no comportamento social. E isso é o interesse primário da obra de Gilberto Freyre.
O fortalecimento de novos profissionais – como médicos e advogados – enfraqueceu, por exemplo, o poder informal exercido pelos padres.

A mulher de sobrado foi encontrando no doutor uma figura prestigiosa de homem em quem repousar da do marido e da do padre, a confissão de doenças, de dores, de intimidades do corpo oferecendo-lhe um meio agradável de desafogar-se da opressão patriarcal e clerical.
A ascensão dos bacharéis brancos se fez rapidamente no meio político neste País que Dom Pedro II. Nem menos indígena e mais europeu. Seu reinado foi o reinado dos Bacharéis Esta mudança influiu até na forma de divertimento. O teatro que no início da colonização foi usado como instrumento de catequese pelos jesuítas, perdeu as cores populares e ganhou um ar europeu.
Também manifestações mais livres, como o carnaval, ganham a prerrogativa de quebrar os rígidos laços da moral agrária.

Numa sociedade como a patriarcal brasileira, cheia de repressões, abafos, opressões, o carnaval agiu, como, em plano superior, agiu a confissão: como meio de se livrarem homens, mulheres, meninos, escravos, negros, indígenas, de opressões que, doutro modo, a muitos teria sobre carregado de recalques, de ressentimentos e fobias.
Com tudo isso cresceu a possibilidade de ascensão social, favorecendo o povo mestiço formado na libertinagem de uma “terra sem pecados”. Cada vez mais européia, a sociedade brasileira precisava de capital para sustentar o luxo de se fazer moderna. Com isso usava o poder econômico criado no campo para financiar o requinte de um urbanismo crescente.
Criava-se assim uma falsa valorização do saber, pois o saber exaltado era aquele construído nos cursos já então ditos superiores. Esta atitude levou para o plano menor a preocupação com o ensino básico.
Outros dois frutos desta supervalorização das coisas vindas do estrangeiro foram:

- primeiro, a opulência das cidades, então reais intermediários entre o ruralista abastado e a Europa;
- e, segundo, a valorização do mulato, muitos nascidos da concupiscência entre senhores e escravas, entre a casa-grande e a senzala. Muitos destes mulatos ganharam nobreza a partir do reconhecimento paterno e sua fortuna sobrepujava os possíveis preconceitos. Criamos assim nossa tão exaltada , em particular, como no social, em geral.

O começo do reinado de Pedro II é o que marca, entre outras alterações na fisionomia brasileira: o começo do ‘romantismo jurídico’ no Brasil, até então governado mais pelo bom senso dos velhos que pelo senso jurídico dos moços.
Com Pedro I, tipo de filho de senhor de engenho destabocado, quebrara-se já quase por completo, para o brasileiro, a tradição ou mística da idade respeitável. (...) Ninguém foi mais bacharel nem mais doutor.
A partir da década de 50 do século XIX se consolidam as mudanças: ampliação do espaço para atividade secundária e terciária, juntamente com o crescimento de segmentos livres, e com ele a ‘viração’. Essa ampliação de espaço deu oportunidade também à constituição de um mercado onde se ofereciam e compravam ‘experiências’, assim como já ocorria com o jogo da força de trabalho. Essas experiências adquiridas no cotidiano da viração e da vadiagem, ganharam um valor de troca. Assim, as habilidades da capoeiragem passaram a ser compradas pelo jogo político partidário. A capoeira a serviço de liberais e conservadores foi um eficiente instrumento de pressão no processo eleitoral (DIAS, 1993: 127). Por vezes os poderes se misturavam, como vemos neste comentário de cronista da Revista Ilustrada, 1878, n.º 124:

Acabaram-se as eleições, e a esta hora jazem a um canto o sabre do urbano e o cacete do capoeira, os dois reguladores da soberania nacional. A capoeiragem foi se afastando de sua condição original de prática urbana de resistência dos despossuídos, assumindo um papel de ameaça à população e à ordem pública, fato legitimador da violenta repressão sofrida pela capoeira durante os primeiros anos da República.

Esta contextualização do espaço sócio cultural mostra que na medida em que o Rio de Janeiro crescia, indivíduos, que de norma vinham das categorias inferiores da estratificação social, cada vez mais organizavam-se. E, este fato, está associado com o início da visibilidade das Maltas de Capoeira no espaço carioca, pois o auge da capoeiragem no Rio de Janeiro ocorreu durante o Segundo Império, período substancialmente rico em elementos que vão nutrir o aparecimento das gangues urbanas.


As gangues urbanas

A formação das gangues é produto de percepções, de um grupo de indivíduos em unicidade, sobre a dinâmica "interacional" de contexto sócio cultural. Esta característica socioecológica e cognitivamente definida não existe isoladamente, se baseia na interpretação que o grupo faz do seu contexto vivencial de acordo com as categorias de sua sociociência.
A capoeira do século XIX, no Rio com as Maltas de capoeira, e em Recife com as gangues de rua dos "Brabos e Valentões" foram um movimento muito semelhante aos movimentos das gangues de Savate em Paris, e das maltas de fadistas de Lisboa do século XIX.

A semelhança está presente no vestuário, como uso de lenço de seda no pescoço; no instrumental de combate (navalha, porrete, bengala e o proprio lenço - que a navalha não corta - diga-se, entre outros...). E, o que mais chama atenção nesta semelhança é que o gestual de luta (comunicação gestual) desses movimentos é também parecido um com o outro. Ou seja, os golpes usados na aguerrida comunicação gestual são semelhantes. O que vai diferenciar é a forma de se comunicar no contexto; cada um cria sua sócio-fronteira, através de sua perspectiva identitária e territorial, com espaços personalizados que vão os diferenciar, com seus atores, entre si, no próprio contexto sócio-cultural.

Da mesma forma, o conjunto destes espaços de sócio-fronteiras vai produzir uma forma única de personalidade social a diferenciar de unidades socio-culturais semelhantes. Por volta de 1850, Nova York, Paris, Marseille, Lisboa, têm registros destes movimentos de gangues de ruas. No Brasil, as cidades do Rio de Janeiro e Recife são as únicas que respondem a estes movimentos globalizados urbanos, através dos movimentos das Maltas de Capoeira cariocas, e no Recife pelas gangues que disputavam os espaços (territórios) relacionados inicialmente com bandas militares, por eles demarcados identitariamente. Desta forma, estas gangues defendiam todas as formas de manifestação rítmicas que estavam dentro de suas sócio-fronteiras. Para isto se incorporavam a cada uma delas.


As Maltas de capoeira carioca

A capoeira vai ter sua presença registrada como grupos de sócio-fronteiras, a partir de meados do século XIX, tanto no Rio de Janeiro como no Recife.
No Rio, ela se apresentou organizada em verdadeiras confrarias denominadas Maltas. Seus nomes variavam conforme a freguesia em se organizavam (espaços de sócio- fronteiras). A partir da década de 50 do século XIX se consolidam as mudanças: ampliação do espaço para atividade secundária e terciária, juntamente com o crescimento de segmentos livres, e com ele a ‘viração’. Essa ampliação de espaço deu oportunidade também à constituição de um mercado onde se ofereciam e compravam ‘experiências’, assim como já ocorria com o jogo da força de trabalho. Essas experiências adquiridas no cotidiano da viração e da vadiagem, ganharam um valor de troca. Assim, as habilidades da capoeiragem passaram a ser compradas pelo jogo político partidário.
A capoeira a serviço de liberais e conservadores foi um eficiente instrumento de pressão no processo eleitoral (DIAS, 1993: 127). Por vezes os poderes se misturavam, como vemos neste comentário de cronista da Revista Ilustrada, 1878, n.º 124:

"Acabaram-se as eleições, e a esta hora jazem a um canto o sabre do urbano e o cacete do capoeira, os dois reguladores da soberania nacional."

A capoeiragem foi se afastando de sua condição original de prática urbana de resistência negra, assumindo um papel de ameaça à população e à ordem pública, fato legitimador da violenta repressão sofrida pela capoeira durante os primeiros anos da República.

Entre 1850-1900 -, as maltas cariocas absorveram os escravos e libertos crioulos (nascidos no Brasil) - os escravos creoulos eram uns 30% em 1850, os livres eram 60% em 1881; os estrangeiros eram 22% em 1885; pardos e mestiços, imigrantes portugueses pobres - os engajados -, os malandros vindos do Porto e de Lisboa - os fadistas -, brancos brasileiros pobres e de outras classes sociais, militares, policiais, jovens estroínas ricos e violentos da jeunesse dorée carioca - os elegantes cordões - e seus equivalentes portugueses - os marialvas -, marinheiros brasileiros e de muitas outras nacionalidades - muitos deles, desertores -, estrangeiros das mais diversas nacionalidades - em 1891, p.ex., Moyses Corull, um negro norte-americano residente à rua da Saúde, foi preso por estar em "exercícios de capoeiragem" (SOARES, 1994, p.134).

A influência dos portugueses fadistas - os malandros e valentes de Portugal - foi grande nas Maltas, já vinham "formados" de grandes centros como Porto e Lisboa. O fadista português não apenas se adaptou, como influenciou o mundo da capoeira carioca. Seu maior legado foi a navalha - que já era cobiçada no início dos 1800s, mas não ainda como o emblema da capoeira por excelência -, um símbolo da "Mouraria lisboeta". Mestre Jair Moura nos explica em “Evolução, apogeu e declínio da capoeiragem no Rio de Janeiro, 1985”:

Poucos capoeiras usavam armas de fogo e quase todos davam preferência à navalha, arma traiçoeira que melhor se ajustava ao seu sistema de pugna. Esta temível arma branca, denominada em Portugal de Santo Cristo, companheira inseparável do fadista truculento, agressivo, só podia ser neutralizada, enfrentada, pelo tiro ou a bengala, quando desferido, ou manejada, por um indivíduo dotado de destreza ou habilidade, como acentua o ilustre Ramalho Urtigão... No Brasil, a maioria dos que se exercitava no treinamento da capoeiragem, ajuntaram a navalha do fadista lusitano.

Além do Santo-Cristo - a navalha de ponta dos fadistas da mouraria lisboeta -, temos de lembrar que o jogo de pau era extremamente popular em Portugal; e não esquecer que os bastões, porretes e bengalas - algumas especiais, como a Petrópolis -, era parte importante e básico no arsenal do capoeira (e também do mundo marginal carioca de 1850-1900).

As maltas de capoeira cariocas como a do Recife nos 1800s, foi fruto de uma opção política e vivencial, referenciada numa experiência social e cultural, alimentada pela vontade de participar em processos culturais e políticos, e levada a cabo com uma maneira de agir, lúcida, inteligente, malandra.

Quase todos os verdadeiros capoeiras foram do serviço de altos personagens políticos, e tudo o que fizeram foi contando com a proteção desses personagens, ou por mando deles. Serviram em todas as situações e a todos os governos da Monarquia.

No Rio - ao contrário da Bahia -, contrariando as afirmações de muitos "puristas" que reclamam do "embranquecimento (recente, das últimas décadas) da capoeira", a capoeira foi miscigenada quase que nos seus primórdios. Capoeirista "foi desde a nobreza, com o Barão do Rio Branco, dentre outros, até o negro escravo.

A capoeira vai ter sua presença registrada como grupos de sócio-fronteiras, a partir de meados do século XIX, tanto no Rio de Janeiro como no Recife. No Rio, ela se apresentou organizada em verdadeiras confrarias denominadas Maltas. Seus nomes variavam conforme a freguesia em se organizavam (espaços de sócio- fronteiras). Assim chamava –se de “cadeira da Senhora” a da freguesia do Santana; de “três cachos” a de Santa Rita ou Flor da Uva; a dos “Franciscanos” a do bairro de São Francisco; por “Flor da Gente” era conhecida a Malta Glória; “Espada”, a da Lapa; a de”Monturo”, a de Santa Rita, também conhecida por Lusitanos; a de “São Jorge” ou “Lança”, a do Campo da Aclamação.

As "maltas" eram grupos de vinte e até cem capoeiras (MORAES FILHO, s/d: 28) que tinham nome, gíria e costumes próprios. Embora existissem "amadores", que eram os capoeiristas não ligados a nenhuma malta, representativamente eram as maltas que assombravam a população. Por volta da proclamação da República a cidade estaria praticamente dividida em dois grandes grupos: as nações, nagoas ou "Nogos" e "Guaimums" (SOARES, 1994:40).
Capoeiragem no Século XIX
"Desenho de Sales, de 1942, que tenta reconstruir o embate entre duas maltas cariocas no final dos 1800s."

Tinham seus sinais característicos e suas saudações típicas. De seu ritual, faziam parte juramento e preces. Tomavam parte de todas as manifestações cívicas e festas populares. Eram vistos durante as paradas, precedidos pelos caxinguelês (aprendizes), gingando à frente dos batalhões durantes as paradas. Tinham espaços de treinos; os "ensaios" eram, estrategicamente, "nos domingos de manhã", dia de folga da escravaria urbana e dos trabalhadores em geral. Já vimos que grande parte dos capoeiras eram escravos domésticos ou trabalhadores.

O capoeira e jornalista, Plácido de Abreu, nos fala (Os capoeiras, 1886), com conhecimento de causa, do ensino nas maltas dos Guaiamus e Nagoas:

"Há pouco tempo o bando guaiamu costumava ensaiar os noviços no morro do Livramento, no lugar denominado Mangueira. Os ensaios faziam-se regularmente nos domingos de manhã e constavam dos exercícios de cabeça, pé e golpe de navalha e faca. Os capoeiras de mais fama serviam de instrutores. A princípio os golpes eram ensaiados com armas de madeira e por fim serviam-se dos próprios ferros, acontecendo muitas vezes ficar ensanguentado o lugar dos exercícios. Os nagoas faziam os mesmos ensaios, com diferença que o lugar escolhido por eles era a praia do Russel, para os partidos (as maltas) de São José e Lapa, e o morro do Pinto para o de Santana."

Mathias Assunção comenta, em relação à técnica de luta, que, nesta época no Rio de Janeiro, além disto:

" ... havia a combinação de cinco técnicas de luta complementares: cabeçada, chute, taponas (de mão), técnicas de faca e pau. Nenhuma fonte sugere que este tipo de combinação jamais tenha existido na África... a transformação do contexto social inevitavelmente tem impacto nos aspectos formais da prática da capoeira... Até que ponto a capoeira "creolizou-se" (isto é, partindo das raízes africanas tornou-se algo diverso, característico do novo local) pode ser visto, mais ainda, pelas mudanças substanciais que afetaram seu significado cultural e político na segundo metade do século XIX (ASSUNÇÃO, op.cit)"

Enquanto os marginais se mantinham ocultos, o capoeira primava pela notoriedade. 
As aparições nas festas populares e os feitos de arrogante coragem, destreza corporal e exibicionismo exacerbado - por exemplo, os capoeiras escalavam os muros, paredes e torres das igrejas e cavalgavam os sinos com seus corpos, ariscando a queda e a morte, fazendo-os soar -, fortaleciam o prestígio da capoeira frente a população; prestígio refletido na crescente presença de adolescentes nos "exercícios de capoeiragem" daquela época.

Moraes Filho, em  Capoeiragem e capoeiras célebres e Festas e tradições populares do Brasil, narra :
"Os capoeiras há até quarenta anos passados (cerca 1850) prestavam juramento solene, e o lugar escolhido para isto era a torre das igrejas...no tempo em que os enterramentos se faziam nas igrejas e que as festas religiosas amiudavam-se, as torres enchiam-se de capoeiras, famosos sineiros que, montados nas cabeças dos sinos, acompanhavam toda impulsão dos dobros, abençoando das alturas o povo que os admirava, apinhado na praças e ruas... torres das igrejas - ninhos atroadores dos capoeiras profissionais."


As gangues do Recife


No Recife, os grupos de capoeira vão mostrar uma organização semelhante, porém vão estar mais atrelados às manifestações rítmicas. As bandas militares, ao que tudo indica, foram às primeiras organizações rítmicas absorvidas pelos espaços iniciais de sócio-fronteiras da capoeira. A pesar dos registros, sobre a organização sócio cultural destas gangues da cidade de Recife, serem muito menores do que os existentes cidade carioca.

A partir das Bandas do 4º Batalhão de Artilharia ou Banha Cheirosa; e o Hespanha ou Cabeças Secas, do Corpo da Guarda Nacional; os grupos criam duas unidades sócio-fronteiriças:

- o partido do 4º ou Banha cheirosa;
- e o partido Hespanha ou Cabeças Secas.

No calor desses desfiles e do repertório em uso pelas bandas militares sediadas no Recife, na segunda metade do século XIX, foi sendo gerado o embrião da marcha-carnavalesca pernambucana, que veio dar origem ao nosso frevo, e, de sua forma coreográfica única, o passo, originário da interpretações que os indivíduos capoeiras faziam de suas leituras vivenciais.

A partir desta perspectiva identitária territorial a capoeira pernambucana travou uma verdadeira batalha através de suas pernadas, sua ginga solta, aliadas à bengala, ao porrete, à navalha, à faca etc. Sendo o frevo, dos espaços rítmicos, o último de suas brincadeiras. Ritmo proveniente destas estruturas de bandas, e o passo da aguerrida comunicação dos capoeiras.

A influência dos desfiles militares, corporações profissionais e procissões religiosas se tornam patente nos cortejos dos clubes carnavalescos (clubes de frevo), desde a disposição das bandas de música, estandartes, símbolos, luxo, heráldica dos distintivos e até cordões de morcegos, lanceiros e mascarados. Lembra F. A. Pereira da Costa (1851-1923), no seu Folk-Lore Pernambucano (1908), a importância do capoeira em tais desfiles, particularmente nos idos de 1856, quando existiam no Recife as bandas musicais do 4º Batalhão de Artilharia, chamado popularmente de Quarto, e a do Corpo da Guarda Nacional, esta conhecida por Espanha por ser seu maestro o espanhol Pedro Francisco Garrido.

"O nosso capoeira é antes o moleque de frente de música, em marcha, armado de cacete, e a desafiar os do partido contrário, que aos vivas de uns, e morras de outros, rompe em hostilidade e trava lutas, de que não raro resultam ferimentos, e até mesmo casos fatais."

Capoeiragem no Século XIX

Pelas descrições de Pereira da Costa, que infelizmente não chegaram até nós musicadas, chega-se a crer que o frevo (música) e o passo (dança) tiveram nos desfiles das bandas de música do Recife, na segunda metade do século XIX, o seu embrião.
“Levavam os capoeiras partidários de música o seu entusiasmo por certas peças, a ponto de comporem versos apropriados ao canto de alguns passos dobrados... E estes outros, cantados no trio de um dobrado do 4º Batalhão de Artilharia, a quem denominavam de Banha Cheirosa, dobrado que levava ao delírio os partidários do Quarto, principalmente quando chegava a parte de uma pancada em falso dada pelo bombo no trio da peça.

Acompanhando o desfile das bandas musicais do Recife desde os primeiros anos da segunda metade do século XIX, o nosso capoeira era, no dizer de Mário Sette, figura obrigatória à frente do conjunto “gingando, piruteando, manobrando cacetes e exibindo navalhas. Faziam passos complicados, dirigiam pilhérias, soltavam assobios agudíssimos, iam de provocação em provocação até que o rolo explodia correndo sangue e ficando os defuntos na rua”.

Beaurepaire Rohan, no seu “Glossário Brasileiro”, publicado na Gazeta Literária, nº 19, Rio de Janeiro, 11 de outubro de 1884, revela que o vocábulo serve para definir “toda a sorte de desordeiro pertencente à ralé do povo. São estes perigosíssimos, por isso que, armados de instrumentos perfurantes, matam a qualquer pessoa inofensiva, só pelo prazer de matar”. No Recife, segundo Pereira da Costa em seu Folk-Lore Pernambucano (1908);

“o nosso capoeira é antes o moleque de frente de música em marcha, armado de cacete, e a desafiar os do partido contrário, que aos vivas de uns, e morras de outros, rompe em hostilidade e trava lutas, de que não raro resultam ferimentos, e até mesmo casos fatais!…”.

Pelas descrições de Pereira da Costa, que infelizmente não chegaram até nós musicadas, chega-se a crer que o frevo (música) e o passo (dança) tiveram nos desfiles das bandas de música do Recife, na segunda metade do século XIX, o seu embrião.

“Levavam os capoeiras partidários de música o seu entusiasmo por certas peças, a ponto de comporem versos apropriados ao canto de alguns passos dobrados... E estes outros, cantados no trio de um dobrado do 4º Batalhão de Artilharia, a quem denominavam de Banha Cheirosa, dobrado que levava ao delírio os partidários do Quarto, principalmente quando chegava a parte de uma pancada em falso dada pelo bombo no trio da peça.

Acompanhando o desfile das bandas musicais do Recife desde os primeiros anos da segunda metade do século XIX, o nosso capoeira era, no dizer de Mário Sette, figura obrigatória à frente do conjunto “gingando, piruteando, manobrando cacetes e exibindo navalhas. Faziam passos complicados, dirigiam pilhérias, soltavam assobios agudíssimos, iam de provocação em provocação até que o rolo explodia correndo sangue e ficando os defuntos na rua”.

Beaurepaire Rohan, no seu “Glossário Brasileiro”, publicado na Gazeta Literária, nº 19, Rio de Janeiro, 11 de outubro de 1884, revela que o vocábulo serve para definir “toda a sorte de desordeiro pertencente à ralé do povo. São estes perigosíssimos, por isso que, armados de instrumentos perfurantes, matam a qualquer pessoa inofensiva, só pelo prazer de matar”.

No Recife, segundo Pereira da Costa em seu Folk-Lore Pernambucano (1908);
“o nosso capoeira é antes o moleque de frente de música em marcha, armado de cacete, e a desafiar os do partido contrário, que aos vivas de uns, e morras de outros, rompe em hostilidade e trava lutas, de que não raro resultam ferimentos, e até mesmo casos fatais!…”.

Pelo depoimento de Pereira da Costa é nos desfiles das bandas de música do Recife que os capoeiras criaram o ambiente necessário ao exercício e à prática da capoeiragem. Ao contrário da estrutura da capoeira de hoje, onde os capoeiras se reuniam em torno de um conjunto de berimbaus, no Recife eles tiveram como o seu habitat no desfile das bandas militares, do 4º Batalhão de Artilharia e do Corpo da Guarda Nacional; esta última uma organização paramilitar, criada por Lei Imperial de 18 de agosto de 1831, com ramificações em todo o Brasil. Ao primeiro conjunto apelidaram de “O Quarto e ao segundo de Espanha”, por ser o seu mestre o espanhol Pedro Francisco Garrido. Nos idos de 1856, segundo a mesma fonte, iniciou-se uma rivalidade entre os capoeiras, aficionados dos desfiles daquelas bandas musicais, que armados de cacetes e facas de ponta passaram a se desafiar:

"Viva o Quarto!
Morra Espanha!
Cabeça seca
É quem apanha!"

Apelidava-se de cabeça seca ao elemento escravo, a mais vil das classes sociais de então, acrescentando Pereira da Costa esta informação deveras preciosa para o entendimento das raízes muito distantes do nosso frevo e, por conseguinte, da sua coreografia única e contagiante, o passo: “Levavam os capoeiras partidários de música o seu entusiasmo por certas peças, a ponto de comporem versos apropriados ao canto de alguns passos dobrados (grifo nosso). E estes outros, cantados no trio de um dobrado do 4º Batalhão de Artilharia, a quem denominavam de Banha Cheirosa, dobrado que levava ao delírio os partidários do Quarto, principalmente quando chegava a parte de uma pancada em falso dada pelo bombo no trio da peça”.

O Diário de Pernambuco, em de 5 de maio 1860, chama a atenção da polícia para os bandos de capoeiras que acompanhavam os desfiles das bandas de música. O mesmo jornal, em sua edição de 15 de dezembro de 1864, transcreve ofício enviado pelo coronel comandante do Exército, sobre o mesmo tema:
"Pelo reprovado costume adotado pelos escravos nesta cidade, de acompanharem as músicas militares, dando a uma ou a outra vivas e morras, apareceram desagradáveis conflitos e isto há muito. Ontem, o partidista de uma dessas músicas — Melquíades — preto, escravo, deu, no meio dos gritos de um e outro lado, uma facada no pardo, também escravo, Elias, dizendo-se ser o ofensor partidista de uma das músicas e ofensor de outra."

Trazendo nas mãos um grosso quirí (bastão de madeira duríssima), ou uma bengala de quina, os nossos capoeiras eram, no dizer de Fernando Pio, in Meu Recife de outrora (1969), “mestres em todos os passos, o corpo inteiro valia como arma ofensiva e defensiva, qualquer dos membros tendo sua atuação definida: com a mão jogavam a tapona, com a perna a trave, o calço, com os pés a rasteira e o temido rabo de arraia”.E seguiam-se os desafios cantados, ao som do dobrado executado pela banda de música
"Não venha!
Chapéu de lenha
Partiu
Caiu
Morreu
fedeu!"

acentuando-se quando da execução do dobrado Banha Cheirosa que levava os capoeiras ao delírio:

Quem quiser Comprar banha cheirosa,
Vá na casa Do Doutor Feitosa
Quem quiser Comprar banha de cheiro,
Vá na casa Do Doutor Teixeira
Banha cheirosa Para o cabelo } bis.
Banha de cheiro Prô corpo inteiro
No calor desses desfiles e do repertório em uso pelas bandas militares, sediadas no Recife na segunda metade do século XIX, foi sendo gerado o embrião da marcha-carnavalesca pernambucana. Esta, por sua vez, veio dar origem ao nosso frevo, e, de sua forma coreográfica única, o passo, originário da comunicação gestual da capoeira. Desta forma, estes registros mostram claramente a capoeira como um dos atores de construção do contexto sócio cultural Pernambucano do século XIX. A capoeira, deste período, é um movimento de perspectiva identitária e territorial, um grupo de personalidade sócio cultural pernambucana.

Nos primeiros anos do século XX, as rivalidades entre às agremiações carnavalescas vieram preocupar as autoridades policiais e responsáveis pelas comissões organizadoras dos carnavais de rua. Por muitas décadas tal preocupação moveu o espírito do carnavalesco pernambucano, preocupado com a segurança dos que dela participavam. Um encontro dos aficionados de um clube com os seguidores do seu rival, era motivo de rixa, pancadaria, tudo no melhor estilo dos tempos em que se digladiavam nas ruas os partidários das bandas rivais, Quarto e Espanha, que veio a servir de embrião ao próprio frevo.
Esses encontros transformavam às ruas em verdadeiros campos de escaramuças e, como conseqüências, enchiam-se de feridos e até mortos, dando trabalho à polícia e serviço extra para os padioleiros encarregados do transporte.Tais conflitos vieram ressuscitar a figura do capoeira. Tal prática era tipificada como crime pelo Código Penal do Império e pelo Código Penal de 1890, tratando, este último, em seu capítulo XIII “Dos vadios e capoeiras”, sendo seus infratores condenados a cumprir penas no presídio da ilha de Fernando de Noronha (Notícias de Fernando de Noronha, 1890).


A Capoeira sem identidade social.


O ano de 1890 foi o mais marcante na repressão policial aos capoeiras em todo o séc. XIX. As peculiaridades políticas daquela época ajudam a explicar este fato. Além de prender os capoeiras às centenas, Sampaio Ferraz os deportava, com o objetivo de impossibilitar a rearticulação dentro da cidade. Os mais importantes chefes de malta, os mais velhos, guardiães da tradição, e os maiores ases da capoeiragem foram afastados do ambiente da cidade, rompendo o elo fundamental da reprodução cultural.
A capoeira dos 1800, do Rio e do Recife, morre com advento da República. Inimiga da Capoeira, a República vem com uma proposta de reformas sociais e urbanas, com críticas à organização e à expressão popular da sociedade brasileira, principalmente no que diz respeito à imagem do Brasil português e à mestiçagem étnica e cultural. Sua proposta alternativa seria baseada no modelo cultural europeu republicano, e qualquer coisa que estivesse fora desses princípios era desconsiderada. Sob influência do positivismo europeu, introduz mudanças que vão alterar a estrutura do espaço cultural carioca.
Entre essas mudanças estava a alteração da forma da malha urbana, com a destruição do morro do Castelo e a introdução, sobre a nova geoforma, de uma estrutura arquitetônica semelhante ao centro da cidade parisiense, com avenidas largas, ruas ventiladas e arborizadas. Este processo é associado a um grande saneamento de hábitos culturais imposto à força para melhoria da qualidade de vida da cidade carioca, que naquele momento sofria de uma série de males produzidos pelo baixo padrão de infra-estrutura de saneamento existente.

Essas mudanças alteraram os nichos culturais e mudaram a geografia cultural da cidade ao perderem-se espaços de expressões culturais, o que levou a desarticular a forma de organização urbana e quebrar a dinâmica interativa da comunidade que a compunha. Assim, alterou-se o processo que personalizava a capoeira, pois mudou o seu contexto social ao mexer-se em seus elementos essenciais. As maltas desaparecidas são substituídas pela solitária figura do malandro.
A capoeira, das Maltas, do Rio e dos Brabos do Recife, foi desmobilizada em menos de dois anos. Toda uma história de mais de quarenta anos se desfaz. No Rio, morrem os grupos de capoeiras e aparece a figura do malandro. Malandro é um indivíduo e a Malta; um grupo social. No Recife, o capoeira vira a figura solitária do Brabo e valentão, que no Rio seria o malandro. Registros memoráveis sobre nossos, brabos e valentões estão nas páginas de Pereira da Costa, Ascenso Ferreira, Mario Sette, Guilherme Araújo, Mário Mello e tantos outros. Mas talvez seja o lendário Nascimento Grande o último dos valentões do período da malandragem romântica do Recife. Nascimento que Gilberto Freyre chamava de "Nascimento Grande de José Mariano", aludindo ao tempo que o capoeirista era aliado do eminente abolicionista, nas lutas libertárias do famoso Clube do Cupim.
Porém, no Recife, a prática da capoeira vai se manter viva, apesar da desarticulação dos grupos de capoeira, durante os primeiros anos do século XX, as rivalidades entre às agremiações carnavalescas vieram preocupar as autoridades policiais e responsáveis pelas comissões organizadoras dos carnavais de rua. Por muitas décadas tal preocupação moveu o espírito do carnavalesco pernambucano, preocupado com a segurança dos que dela participavam. Um encontro dos aficionados de um clube com os seguidores do seu rival, era motivo de rixa, pancadaria, tudo no melhor estilo dos tempos em que se digladiavam nas ruas os partidários das bandas rivais, Quarto e Espanha, que veio a servir de embrião ao próprio frevo. O registro do Jornal A Pimenta (nº 28), ao descrever cenas do carnaval de 1901, tecer o seguinte comentário: “um indivíduo, julgando-se muito engraçado, vinha na frente, à moda capoeira”; costume também denunciado, em fevereiro de 1907 pelo Jornal Pequeno: “Fazendo exercícios de capoeiragem vinha ontem, a 1 hora da tarde, em frente ao Clube Carnavalesco Tome Farofa, o indivíduo Anselmo Arcelino Marinho. Este indivíduo com um compasso escalado investiu contra o diretor daquele clube.
Mas a capoeira pernambucana desaparece por total, o que mostra que os espaços sócios culturais que estimulavam sua continuidade não lhe permitiam assumir sua personalidade identitária e territorial. Seu retorno só será possível nos anos 70 do século XX, porém de uma forma esportiva e não sócio cultural, totalmente distante de sua perspectiva identitária e territorial das gangues urbanas do séc. XIX , ou seja; destituída de sua personalidade pernambucana.

Daí começa o processo da construção da capoeira esportiva: A capoeira atual. Tendo duas linhas básicas: a carioca com sua ginástica nacional e a baiana com seu Projeto Regional.


A capoeira esportiva

Durante todo os 1800s a capoeiragem carioca tornou-se cada vez mais visível e atuante. Da capoeira baiana, neste século XIX, não temos nenhuma notícia; a não ser alguns obscuros indícios, já a partir de 1900. Esta constatação é algo surpreendente, pois, tanto no discurso da maioria dos capoeiristas, quanto nos estudos que enfocaram a capoeira até aproximadamente 1990, era suposto que a capoeira era "da Bahia".
Os discursos que existem registrados entre , 1900 a 1930, sobre a construção da capoeira esportiva é dos intelectuais cariocas.
"À medida que as identidades nacionais foram cada vez mais construídas em volta de manifestações da cultura popular, e as elites foram se tornando cada vez mais conscientes que a única homogeneidade visível do povo brasileiro consistia num imenso contexto de misturas, a atitude em relação à capoeira evoluiu substancialmente. Na própria época em que a capoeira estava sendo erradicada das ruas do Rio (no final dos 1800s) através de uma repressão desregrada, a criminalização absoluta de sua prática estava sendo cada vez mais questionada por um número crescente de pessoas da classe média. Adotaram uma atitude mais benevolente, embora fortemente ambivalente, em relação a arte, pois a consideravam (a capoeira) uma possível ferramenta na construção de uma identidade brasileira. No entanto para a capoeira tornar-se uma marca de brasilidade, suas origens das classes mais baixas(escravos,e livres pobres) teriam de ser ocultadas e seu caráter mestiço enfatizado. (ASSUNÇÃO, op.cit., 2005, p.15)"
Bem cedo, durante o começo do séc. XIX na Europa, começaram tentativas de desenvolver métodos nacionais específicos de treinamento .
Na Dinamarca, Franz Nachtegall (1777-1847) fundara o Instituto Militar de Ginástica, em 1804; já em 1814, a educação física tinha se tornado uma disciplina obrigatória nas escolas dinamarquesas. Na Alemanha, Friedrich Ludwig Jahn (1776-1839) construiu o primeiro parque de ginástica (Turnplatz) em 1811, iniciando o movimento das Associações de Ginástica (Turnverein). Desde então, a ginástica tem sido vista como um meio de melhorar a forma física masculina da nação e, em conseqüência, sua capacidade marcial. Por esta razão, os militares sempre estiveram associados com a busca de uma ginástica nacional.
Neste contexto, a vitória japonesa sobre a Rússia, em 1905, contribuiu para o questionamento, até mesmo o desmoronamento do estereotipo anterior do oriental efeminado, e despertou o interesse ocidental nas artes marciais orientais, em particular o Budo (caminho do guerreiro) japonês. Mestres de jiujitsu começaram a viajar pelo mundo para mostrar suas habilidades e desafiar lutadores locais, como o caso registrado no Jornal do comercio do Rio de janeiro, em 02/05/1909, sobre a luta entre Cyriaco ( Cyriaco Francisco da Silva) e o instrutor militar da Marinha Brasileira e campeão japonês de jiujitsu Sada Miyako :
" O jornal narra o seguinte: 'Diversos freqüentadores do Pavilhão Nacional Paschoal Segreto vieram ontem a esta redação apresentar o Sr. Cyriaco Francisco da Silva, dizendo-se o mesmo senhor vencido o jogador japonês que se exibe atualmente naquela casa de diversão. "O Sr. Cyriaco é brasileiro, trabalhador no comercio de café e conseguiu vencer o seu antagonista aplicando-lhe um "rabo de arraia" formidável, que no primeiro assalto o prostrou."O brasileiro jogou descalço e o japonês pediu que não fosse continuada a luta." Ficam assim cientes os que se preocupam com o novo esporte que ele é deficiente. Basta estabelecer o seguinte paralelo: no jiu-jitzu a defesa é mais fácil que o ataque; na capoeiragem a grande ciência é a defesa, a grande arte é saber cair."
Isto resultou numa intensa interação entre artes marciais do ocidente e oriente. Para os nacionalistas brasileiros estes acontecimentos confirmaram a urgência em identificar e desenvolver uma arte de luta brasileira e, mais uma vez, voltaram sua atenção para a capoeira.

Depois de 1930 – quando, a segunda fase do período Republicano, afim à valorização do território anunciado pelo Modernismo, tenta determinar a imagem concreta de um povo nacional, para acrescentá-la à Nação e ao Estado elaborados pelo Império -, o elemento mestiço ganha cores decididamente positivas. Por isto, é seminal a obra de Gilberto Freyre, em especial Casa Grande e Senzala (1933).Ao lado de Freyre, reformulando as linhas interpretativas anteriores com novos argumentos das ciências humanas e sociais, situam-se Caio Prado Júnior (Evolução Política do Brasil, 1933) e Sérgio Buarque de Holanda (Raízes do Brasil, 1936).
Quando o universo interpretativo da origem e identidade da capoeira muda, há uma ruptura da capoeira como movimento social. Nasce uma capoeira sem identidade social, construída a partir dos discursos intelectuais, tanto o carioca como o baiano.

A capoeira atual tem toda sua construção relacionada aos discursos nacionalistas do final do século XIX e começo do XX, em duas linhas básicas: a capoeira carioca, com sua “ginástica nacional”, e a baiana, com seu “projeto regional”.


A proposta Carioca: A Ginástica Nacional

Com a dissolução das maltas, a energia que as mantinha unida e lhes permitia alcançar peso em negociações políticas, dissolve-se no cotidiano. Parte dessa energia é canalizada para outras manifestações culturais, sobretudo na área da música e do carnaval. Surge o maxixe e o samba, organizam-se os ranchos e as escolas de samba. As freguesias dão lugar a bairros e no lugar dos cortiços e dos mocambos, surgem as favelas. O malandro transforma a ginga guerreira no passo de samba do mestre-sala. A lembrança das maltas é aos poucos esquecida, mas o malandro ainda guarda a navalha. Em seu corpo, inconscientemente, mantém-se os gestos de uma linguagem reprimida, que se transmite corporalmente. Como vimos acima, esta fase é marcada por grandes mudanças no contexto carioca, tanto em termos culturais como físico. A capoeira carioca sua perspectiva de movimento de desobediência e concomitante o identitária é desarticulado, tanto no seu ideário como em relação aos seus nichos territoriais. A cidade é redesenhada sob a ótica do positivismo Europeu e sua malha urbana ganha imagens cênicas Parisiense, associada as necessidades de melhorias sanitária.
Neste contexto surge a estrutura morfológica que irá propiciar a sedimentação nutricional do exacerbado nacionalismo, de direita e esquerda, dos anos 30 e 40. O ideário nacionalista é que vai moldar a forma da capoeira moderna Nesta perspectiva, a capoeira carioca já a partir dos finais do sec. XIX é despida de seu conteúdo identitário e territorial, ou seja, sua alma. Seu conteúdo gestual é condensado em metodologia estruturada para luta marcial nacional, sobrando como aspecto simbólico a reminiscência da figura do capoeira da velhas maltas, a figura solitária e lúdica do malandro carioca,que se espalha nos fragmentos cênicos das antigas áreas territoriais maltense.
O Rio de janeiro se torna assim o grande difusor da capoeira nacional, pois foi à base das propostas de estilos na capoeira moderna, como iremos ver mais adiante na criação dos estilos da capoeira baiana.
Apesar da capoeira ter sido posta fora de lei no primeiro Código Penal da República (1892) - seis meses a dois anos àquele encontrado "em práticas corporais e de agilidade conhecidas como capoeiragem" -, e sua prática, desportiva, em recintos fechados e com alvará de polícia, só ter sido permitida após a subida de Getúlio Vargas, na década de 1930, como apoio popular à "retórica do corpo"162; o que acontecia, na realidade, era que o discurso de Mello de Moraes - admirador da "herança mestiça" e dos "verdadeiros capoeiras de fama", brancos e pertencentes às classes dominantes além dos valentes mestiços e negros chefes de maltas em oposição ao "povo baixo" que, na verdade, constituía a maioria da capoeiragem - foi florescendo, apesar da proibição.
O discurso de Mello Moraes frutificou plenamente com Coelho Neto no ensaio "O nosso jogo", publicado em Lisboa na revista Bazar, em 28/10/1922; proseguindo, em 1928, com Anibal Burlamaqui que lançou com bastante repercussão seu Gymnastica Nacional (capoeiragem) Methodizada e Regrada;
Em 1906, a luxuosa Kosmos, Revista Artistica, Scientifica e Literaria, do Rio de Janeiro, publica um artigo de Lima Campos: "A Capoeira", ilustrada por Kalixto. Este artigo, é um registro da construção da capoeira moderna, sua arquitetura tem como base o movimento nacionalista do final do século XIX, o qual se estenderá até meados do século XX. Lima Campos enaltece a vocação cultural mestiça da capoeira carioca e mostra a destruição da capoeira de movimento social, pela República e a gênese da proposta moderna da capoeira; A ginástica Nacional.

"Das cinco grandes lutas populares: a savata francesa, o jiu-jitsu japonês, o box inglês, o pau português e a nossa capoeira, temiveis pelo que possuem de acrobacia intuitiva de elastério e de agilidade em seus recursos e avanços táticos e em seus golpes destros é, sem duvida, a última, ainda desconhecida fora do Brasil, mesmo na América, a melhor a mais terrível como recurso individual de defesa certa ou de ataque impune.
Nas outras (com bem limitada exceção de apenas alguns golpes detentivos ou de tolhimento no Jiu-jitsu e a limitadíssima exceção do célebre círculo defensivo descrito pelo movimento giratório contínuo do pau no jogo português) o valor está no ataque; na capoeira porém, dá-se o contrario: o seu mérito básico é a defesa; ela é por excelência e na essência defensiva. Lima Campos: "A Capoeira", 1906 Kosmos, Revista Artística, Scientifica e Literaria."

A capoeiragem ficou proibida nas ruas do Rio de Janeiro durante todos os trinta primeiros anos do século XX. Por ser Capital Federal, a repressão tornou-se mais exigente na cidade. Por sua ambigüidade, o malandro pôde-se manter como um personagem ativo das ruas e da boêmia e se tornou um símbolo do Rio de Janeiro, pronto para exportação. Enquanto isso, o capoeira foi esquecido.
Esta foi uma estratégia arquitetada pela república, de grande êxito, para acabar com os movimento identitário de desobediência, pois tirou a força destes movimentos e, como o caso da capoeira, retirou toda a força de sua magia e a deixou como um zumbi, ou seja, com a forma de seu corpo mas sem a energia de sua alma.
Propostas de métodos capoeira como luta nacional, surgida no Rio de Janeiro, já no final deste período, demonstram muito bem isto, como iremos ver no próximo segmento. A capoeira reaparece, nesta fase, com uma roupagem nova, perde sua perspectiva de movimento de desobediência, perde sua movimentação espontânea, onde a intuição de si e do ambiente de convivência é a base do saber, para uma indumentária tecida em perspectiva nacionalista, de direita e esquerda, que levam a homogeneização do espaço e do indivíduo. Este período vem marcar a edificação da capoeira moderna, onde as propostas cariocas tecidas no período pós-maltas ganham forma tanto no Rio de janeiro como na Bahia. As idéias nacionalistas estão em grande ebulição e a capoeira entra na dinâmica de suas correntes. As diferenças entre elas estarão presentes nos discursos, que vestirão a simbologia criada no processo de adaptabilidade da estrutura do sistema nacionalista.
Dentro deste contexto a capoeira moderna apresenta dois eixos de formação na sua fase de criação: o carioca e o baiano. Sendo que a carioca vai subsidiar o baiano, através de suas propostas metodológicas.
Três personagens tecem a estrutura desta fase inicial da capoeira moderna, um no Rio de janeiro e dois na Bahia. No Rio aparece o Mestre Sinhozinho e na Bahia, o Mestre Bimba, como elemento principal e o Mestre Pastinha como seu contra ponto.
A capoeiragem ficou proibida nas ruas do Rio de Janeiro durante todos os trinta primeiros anos do século XX. Por ser Capital Federal, a repressão tornou-se mais exigente na cidade. Por sua ambigüidade, o malandro pôde-se manter como um personagem ativo das ruas e da boêmia e se tornou um símbolo do Rio de Janeiro, pronto para exportação. Enquanto isso, o capoeira foi esquecido.
Esta foi uma estratégia arquitetada pela república, de grande êxito, para acabar com os movimentos identitário de desobediência, pois tirou a força destes movimentos e, como o caso da capoeira, retirou toda a força de sua magia e a deixou como um zumbi, ou seja, com a forma de seu corpo mas sem a energia de sua alma. A perspectiva que sobrou foi a esportivação de sua aguerrida comunicação gestual e somado a este fato temos a febre do ideário nacionalista que domina os estados nacionais, com a procura de raízes antropológicas da formação da sociedade que e a oposição ao ideário do estado nacionalista.
Em um artigo da revista Bazar de 1922, Coelho Neto, repete 20 anos depois,Lima Campos. Seu artigo enaltece a capoeira com luta nacional de grande eficiência sobre as demais. Mostra a trajetória da estrumação da capoeira como esporte nacional. Este artigo tem uma importância, pois além de ter sua divulgação no Correio do Povo de Porto Alegre, que mostra a circularidade no contexto nacional, das idéias que discutiam o espaço carioca, registra importância, do contexto cultural na construção do ideário nacional. Fato que, que vem confirmar, a influência, destas idéias na arquitetura da capoeira moderna do Mestre Bimba.
“A capoeiragem devia ser ensinada em todos os colégios, quartéis e navios, não só porque é excelente ginástica, na qual se desenvolve, harmoniosamente, todo o corpo e ainda se apuram os sentidos, como também porque constitui um meio de defesa pessoal superior a todos quantos são preconizados pelo estrangeiro e que nós, por tal motivo apenas, não nos envergonhamos de praticar. (negrito do Editor) Todos os povos orgulham-se dos seus esportes nacionais, procurando, cada qual dar primazia ao que cultiva. O francês tem a savate, tem o inglês o boxe; o português desafia valentes com o sarilho do varapau; o espanhol maneja com orgulho a navalha catalã, também usada pelo "fadista" português; o japonês julga-se invencível com o seu jiu-jitsu e não falo de outros esportes clássicos em que se treinam, indistintamente, todos os povos, como a luta, o pugilato a mão livre, a funda e os jogos d`armas.. “ NOSSO JOGO” Coelho Netto, O BAZAR " 1922”
O artigo, transcrito acima, mostra bem o universo no qual a capoeira das Maltas carioca destruída, pela República é ressuscitada, porém de uma forma simbólica, pois é enaltecida em nome do nacionalismo, da raiz brasileira que é a nova coqueluche do final do século XIX e o início do XX. O interessante é aceitação da mestiçagem cultural como elemento da construção da cultura carioca. Idéia, que se colocada nos dias de hoje, cheira, para alguns segmentos, que vê na perspectiva da mestiçagem, algo como descriminação ou mesmo racismo.
Este quadro, do surgimento do nacionalismo, vai produzir no Rio de Janeiro várias propostas de métodos capoeira como luta nacional. A primeira surge em 1874, Raul Pederneira descreve na Gíria Carioca a primeira nomenclatura de movimentos e defende uma “desesportivização” da Capoeira. Em 1907, O aparece, de autor desconhecido, uma proposta que surge dentro do contexto militar e tinha como título; “O Guia da capoeira - A Ginástica Brasileira”. A segunda proposta de método, também vem do ambiente militar, seus autores o capitão Ataliba Nougueira e os tenentes, Lapa e Leite, foi publicado em 1916. Em 1928 Annibal Burlamaqui, conhecido como Zuma, publica “Ginástica Nacional – Capoeiragem – Metodizada e Regrada. Todas estas propostas são baseadas no contexto da comunicação gestual da capoeiragem carioca, o que evidencia a riqueza deste contexto em termos conteúdo para a criação de um método racional de movimentos, ou seja, a quebra da organicidade da comunicação gestual da capoeira, a quebra de um movimento de desobediência. O Rio de Janeiro foi a base no que concerne a difusão de idéias sobre as formas de aproveitamento da capoeira como esporte nacional e está perspectiva, tudo indica, foi aproveitada na construção da capoeira baiana, discutida mais adiante.
Liberac em sua analise sobre o surgimento da capoeira moderna baiana afirma: O Rio de Janeiro foi um ponto alto no que concerne à difusão de idéias sobre formas de aproveitamento da capoeira como esporte nacional e que foi a base política ao movimento em direção às academias. Este cenário mostra o afastamento total da capoeira com o corpo cultural exibe um campo fértil para a transformação em luta marcial, diferentemente do contexto que a capoeira baiana moderna é construída.
Neste, momento nasce a perspectiva da capoeira como luta nacional – a ginástica nacional – movimento defendido por intelectuais cariocas, bem registrados, em jornais, tablóides durante o período que vai do final do século XIX, até os anos trinta do século XX, Porém, o Rio tem a pecha de ter seus movimentos populares ligados a Monarquia e, por este fato é na fase de maior expressão política do nacionalismo no Brasil, o Estado Novo, na pessoa de Getúlio Vargas, que esta ginástica Nacional vai se estruturar na Bahia, na Cidade de Salvador, bem menos diversa e mestiça do que o Rio de Janeiro. Encabeçando este movimento, está à figura de Manoel do Reis Machado, o Mestre Bimba, com sue projeto regional. Para o estado novo a capoeira seria a edificação do sport nacional, porém, este deveria surgir completamente despido da perspectiva orgânica do movimento identitário de forte perspectiva territorial, que caracterizou a capoeira construída no espaço carioca. Em Salvador, não se tem história destas gangues urbanas, no século XIX e com isto, a ginástica nacional de cunho carioca é facilmente adaptada a percepção do Mestre Bimba. Encontra em Salvador um espaço livre e fértil para o seu desenvolvimento: surge o projeto Regional Baiana, “a capoeira moderna”.

A capoeira, do contexto carioca do século XIX, tinha forma e essência de um movimento libertador. É dentro deste contexto que ela se apresentou como elemento de informação cultural, que com sua linguagem gestual marcou espontaneamente, seu espaço na geografia da cidade do Rio de Janeiro, através da interpretação que seus componentes fizeram da realidade cultural vivencial.
É importante perceber que este "proposta" da Luta Nacional, que vai ocupar o cenário intelectual da capoeira carioca no período 1900-1930, e que se continua a estudar até os dias de hoje, não é apenas "história" - algo que foi, mas "já era". A "proposta" continua viva e ative até hoje, tanto em sua forma pura - a "Luta Nacional" -, como "mestiçada" à outras propostas.

Bem mais tarde - 1945 -, Inezil Pena Marinho, ainda sob as diretrizes gerais da "retórica do corpo" de Vargas e na seqüência de Burlamaqui, publica o seu Subsídios para o estudo da metodologia e treinamento da capoeiragem (Rio de Janeiro, Imprensa Nacional). Mais tarde em 1956, publicará os Subsídios para a história da capoeiragem no Brasil. No entanto, apesar de ter tido aceitação nos (poucos) círculos de Educação Física que se interessavam em transformar aquele "folclore" numa atividade racional e regrada - e de continuar a ter aceitação, até hoje, nos mesmos círculos, atualmente muito mais amplos mas igualmente desinformados -, o livro de Inezil teve pouco sucesso entre os capoeiristas. O sucesso, em termo de vendas e influência direta, só viria depois, com um manual de cunho eminente prático, Capoeira sem mestre, de outro autor - o tenente da marinha, Lamartine Pereira da Costa -, já na década de 1960.
Dentro deste cenário - Luta Nacional - implementado pelos segmentos hegemônicos (principalmente) cariocas, também temos as trajetórias e as estratégias de mestre Bimba com seu Projeto Regional a fase baiana e também o inicio das academias - uma capoeira "civilizada" ensinada e praticada em "academias" -, que dura até nossos dias.

No entanto, em Bimba, não serão descartadas a herança negra e marginal (o discurso intelectual afro brasileiro). Em oposição ao que teria acontecido se o projeto - "luta nacional" - dos cariocas Mello Moraes, Burlamaqui, Coelho Neto, Inezil Pena Marinho, Lamartine Pereira da Costa, etc., tivesse tido sucesso absoluto e se tornado hegemônico.


A Capoeira Carioca do Mestre Sinhozinho

A capoeiragem moderna carioca tem como principal representante o Mestre Sinhozinho (Agenor Moreira Sampaio 1891- 1962). Sinhozinho chega ao Rio, aos dezessete anos, em 1908, vindo de Santos (SP). Era um aficionado por esporte e ao chegar já era um entusiasta em futebol, fazia luta romana e praticava ginástica de aparelhos. Mas foi no Rio, principalmente na Lapa, que viu e se apaixonou pela plasticidade e funcionalidade da temível gestualidade dos malandros, durante os acertos de suas pendengas, que se davam por este tipo de comunicação, denominada aqui de comunicação gestual da capoeira.
Sinhozinho foi morar no morro de Santo Antônio, vivenciando toda a realidade cultural carioca, subsídio para organizar uma estrutura de luta que tivesse por base os elementos da comunicação gestual da capoeiragem carioca, encontra alem disto uma estrutura esportiva que tem a capoeira como sua edificação, veja as propostas de métodos já existentes no cenário carioca. Mas, o mais interessante, é que a capoeira numa perspectiva metodizada está dentro de sua ótica esportiva, sendo assim facilmente absorvida por ele. De interessante a provável mistura feita, por ele entre o universo dos métodos e do contexto dos malandros.

Em 1930, após já ter uma vivência em termos de movimentação de lutas e atividades esportivas, pois neste período foi instrutor de educação física, campeão de levantamento de peso, instrutor da Policia especial do Distrito Federal entre outros, reuniu sua primeira turma de alunos particulares, a quem ensinava capoeira de graça.
Sua primeira "academia" no Quintal de sua casa na rua Redentor, foi também a primeira academia de ginástica de Ipanema. Depois, sempre em Ipanema, passou por diversos endereços, como nas ruas Visconde Pirajá, Saddock de Sá e muitas outras, terminando na rua Prudente de Morais em frente à praça General Osório, quando morreu em 1962.

SINHOZINHO - marcou o cenário da capoeiragem moderna carioca, nos anos 30, 40 e 50, formando capoeiristas, boxeadores e remadores. Entre seus alunos famosos destacam-se Tom Jobim, que foi uma personalidade do mundo musical carioca e brasileiro e, como capoeira e desportista Rudolf Hermanny, que foi também campeão de judô no Pan-Americano do México em 1960. Entre os que participavam, do seu espaço de movimentação, podemos destacar: Paulo Azeredo, Paulo Amaral, Sílvio M. Padilha, André Jansen, Bruno e Rudolf Hermanny, Luiz Pereira de Aguiar (Cirandinha), Eloy Dutra, Carlos Alberto Petezzoni Salgado, Joaquim Gomes (Kim), Telmo Maia, Tom Jobim, Carlos Madeira, Darke de Mattos, Comandante Max, Paulo Lefevre, Paulo Paiva, Bube Assinger, Wanderley Fernandes (Pára-quedas), José Alves (Pernambuco), Carlos Pimentel, Lucas e Haroldo Cunha, Manoel Simões Lopes, Flávio Maranhão, Carlos Alberto Copacabana, e numerosos outros. Foram gerações sucessivas, daí a dificuldade de citar todos.


A proposta Baiana: Projeto Regional

A capoeira regional, de Mestre Bimba, surge com um grande diferenciador para a proposta carioca; tem uma proposta racional de um método, com um suporte intelectual estruturado na concepção Afro baiana. Fazendo relações com manifestações sócios culturais baiana, como candomblé e outras manifestações culturais negras da Bahia. E referida nos romances e personagens de Jorge Amado: há valentões e desordeiros e também jogadores mais lúdicos, como Samuel Querido-de-Deus.
O discurso da capoeira baiana tem na proposta Regional de Mestre Bimba, a sua perspectiva funcional e no discurso intelectual afro baiano a vestimenta para esconder sua essência racional. Desta forma, ele se apropria de toda a construção da proposta carioca que o antecede quase 40 anos e, se estabelece como hegemônico. Talvez a falta de uma origem como movimento social da capoeira em Salvador tenha facilitado à construção desta proposta de capoeira, que chega aos dias de hoje e espalha-se pelo mundo todo. Esta relação tem em muito haver com a preocupação dos intelectuais com a questão Afro brasileira.

No período da construção do Projeto Regional, ocorrem dois congressos; em 1934 em Recife e o de 1937 em Salvador. O primeiro em 1934, em Recife e organizado por Gilberto Freire; o 1º Congresso Afro-Brasileiro do Recife foi o menos solene dos Congressos. Nele não brilhou um colarinho duro. Não apareceu um fraque. Não trovejou um tribuno. Não houve um só discurso em voz tremida. Foi tudo simples e em voz de conversa". O depoimento acima foi extraído dos anais do primeiro Congresso Afro-Brasileiro do Recife, realizado em 1934, um ano após a publicação do livro Casa Grande & Senzala. Trata-se do relatório de Gilberto Freyre, organizador do encontro, sobre os dias em que diversas pessoas da sociedade, pela primeira vez, se reuniram para discutir um assunto até então inédito no meio intelectual. Numa época onde a orientação marxista dominava, o pensamento sociológico e os modernistas exaltavam e colocavam o índio e não o negro como maior contribuidor para a formação de uma identidade nacional, Freyre foi odiado por muita gente. Chamado de Subversivo, conspirador e comunista. Estes, entre outros, foram os adjetivos usados para definir a postura de Gilberto Freyre e a equipe formada por ele, para realizar no Recife o 1º Congresso de Estudos Afro-Brasileiros. Três anos depois, em 1937, na cidade de Salvador, na Bahia, realizam – se as atividades do Segundo Congresso Afro-Brasileiro. Organizado pelo Governo do Estado sob liderança de Edison Carneiro (1912-1972), Áydano do Couto (1914-1985) e Reginaldo Guimarães, o encontro teve apresentações de teses e homenagens a Nina Rodrigues. Após a realização desse encontro, no dia 03 de agosto de 1937, fundava-se, com o apoio dos participantes, a União das Seitas Afro-Brasileiras da Bahia. Também foi produzido um livro, contendo os trabalhos escritos apresentados no evento, intitulado “O negro no Brasil” de Edson Carneiro, apresentações de teses e homenagens a Nina Rodrigues. Ambos estes conclaves foram predominantemente acadêmicos ou descritivos. Exploraram o que se pode chamar de temas de africanologia, bem como o pitoresco da vida e das religiões de certa parcela de negros brasileiros. Apesar da participação de elementos de cor, esses dois foram congressos "brancos”. Esta colocação é interessante, pois estes encontros vão ter uma resposta no congresso no Rio de Janeiro. "brancos” .
Estes dois congressos foram importantes porque enfocaram a identidade negra como formadora da nação em seus aspectos culturais, sendo parte integrante junto com brancos e índios do que a ideologia da “democracia racial brasileira” produziu: a brasileiro. Cria-se o que Guimarães Rosas denominou de “metarraça”, “um povo”, “o povo brasileiro”, pensamento nitidamente localizado como sendo o principal vetor de interesse destes Congressos. Ainda conforme Guimarães, “os negros na política republicana, são apropriados como objetos culturais, símbolos e marcos fundadores de uma civilização brasileira, mas têm negado o direito a uma existência singular plena como cidadãos...”.
Neste contexto, o momento baiano, entre a década de 30 e 40 do século XX, foram o da consolidação do projeto Regional, ou seja acapoeira baiana.Apesar dos congressos não definirem a questão afro brasileira, os intelectuais da esquerda baiana,tinham, no seu contexto, sua próprias definições para este questionamento. Desta forma, usam, ou melhor, se apropriam do projeto Regional do Mestre Bimba e pegam uma grande carona. Dando, desta forma, legitimidade a idéia afro baiana. E, mesmo discordando e tendo uma resistência muito grande em aceitar idéia do Mestre, que era vazia de discurso sócios culturais percebem que a proposta da Luta Regional, desprovida destes discursos é que possibilita a inserção da capoeira no universo do Estado Novo. Mestre Bimba não foi convidado para o congresso em Salvador, mas sim, elementos capoeiras que faziam um gestual próximo do que se imaginava ser de identidade afro: o estilo angola. Neste momento nasce no espaço da capoeira de Salvador o discurso afro da capoeira.
Manoel dos Reis Machado, Mestre Bimba. Bimba abriu, numa academia de Salvador, suas aulas de “Luta Regional Baiana”, apresentando um treino disciplinado onde se aprendiam golpes numa seqüência padronizada. Além de golpes novos e treinos sistemáticos, introduziu elementos musicais como o pandeiro e o berimbau, formando a bateria, onde através de vários ritmos , associados a cânticos se praticava a luta marcial. Talvez evitando associações com a capoeira, que era ainda proibida, chamou de luta regional. Regional porque dizia que era originária de sua região, no Recôncavo baiano.
Lembrando aqui, que a construção do processo de capoeira como esporte, tanto da regional de Bimba, como a de Sinhozinho, conviveu com a existência de algumas propostas de métodos organizando a estrutura da capoeira para uma luta marcial.
É, neste período, que a estratégia nacionalista de Getúlio Vargas, coopta a Capoeira e abre o caminho para transformá-la em Educação Física e Esporte, dentro de seu projeto populista.

Foi assim que Mestre Bimba apresentou ao Interventor da Bahia (espécie de Governador na fase Getuliana), uma exibição de sua luta, recebendo permissão para legalizar sua academia, dando início ao período da moderna capoeira. Em 1934, Getúlio Vargas, interessado no voto feminino, dos analfabetos, dos soldados, etc, extingue o decreto-lei que proibia a Capoeira e a prática de cultos afro-brasileiros. Mas, por outro lado, obriga que tanto os cultos quanto à Capoeira sejam realizados fora da rua, em recintos fechados, com um alvará de instalação. A iniciativa de Bimba teve um imenso sucesso, ganhou projeção nacional e foi adotada pelo próprio regime do Estado Novo como exemplo de “Luta Nacional” tirando a capoeira do limbo da rejeição. Manoel dos Reis Machado chegou a ser chamado para dar treinos nas Forças Armadas e na Academia de Polícia.
Segundo Liberac Mestre Bimba, passou por um longo percurso até chegar a hierarquia superior no que tange a “cultura popular”. Ele reelaborou a capoeira construindo-a como símbolo cultural. Para construção de sua luta regional, Bimba redesenha a estrutura do gestual da capoeira que praticava em Salvador sua realidade cultural baiana, pois ele achava que capoeira, ali praticada, muito fraca como luta, por possuir um numero de golpes reduzidos e seu uso era mais para exibições em praça pública por “pseudos-capoeiristas”. Na construção de sua perspectiva de luta buscou no Batuque e nos movimentos de luta vivenciados e em manuais de luta marcial de seu tempo, os elementos que vão estruturar a sua luta regional, lembrando que teve, provavelmente, grande ajuda do grupo de alunos que o cercava, pois a grande maioria era da elite de Salvador e de grau de educação refinado. Mestre Bimba criou as geniais seqüências de ensino para a prática de golpes e contragolpes, seqüências que eram assimiladas mentalmente pelos seus alunos e utilizadas durante os treinamentos. Estas seqüências revolucionaram o ensino da capoeira. Ele também dava aulas teóricas e práticas de como utilizar a “malícia” da luta em determinadas situações. Com relação às bases filosóficas, teóricas e práticas da Regional.
Saiu de Salvador, no inicio da década de 70, decepcionado com a não compreensão de seu trabalho por parte dos baianos. Sua escola nunca foi bem vista por intelectuais baianos, estes sempre se esqueceram em suas análises, de que a perspectiva do Mestre Bimba, era de fato a base da capoeira moderna. Nela todos se miraram inclusive os ditos “angoleiros”, pois se a regional do Bimba surgiu não foi por mera coincidência, faltava no que se intitulou capoeira baiana algo, em seu gestual, e este algo era sua fragilidade para contendas.Em entrevista registrada no ensaio de Waldeloir Rego , Bimba fala que criou a capoeira regional por achar que a brincadeira da capoeira em Salvador era muito fraca, boa para divertimento, mas não para educação física e defesa pessoal. Morreu fora de sua terra, porém de pé.

Na década de 40, outro baiano, Vicente Ferreira, o Mestre Pastinha, aproveitando a abertura feita pelo Mestre Bimba e o suporte do segmento de intelectuais anti Bimba, organizava seu “Centro Esportivo de Capoeira Angola” no Largo do Pelourinho. Enquanto Bimba afirmava a origem brasileira da capoeira, Pastinha, provavelmente influenciado por intelectuais baianos , chamava seu jogo de Capoeira de Angola, pois dizia que ela havia vindo da África e ele a teria aprendido de um negro africano. Enquanto Bimba enfatizava o lado disciplinador, guerreiro e ginástico de sua luta, Pastinha falava de “vadiação”, malandragem e “brincadeira”. Na década de 30 a presença dos intelectuais baianos na construção da capoeira é marcada pelas interferências e manipulações de símbolos culturais. A escolha do estilo angola como a capoeira verdadeira, se apresenta como contra ponto a penetração do Mestre Bimba na esfera do poder político,isto fica bem claro na participação dos chamados angoleiros no congresso Afro-brasileiro de 1937 e a exclusão do mestre Bimba deste evento. Lembrando que nesta fase Mestre Pastinha não fazia parte deste universo baiano de capoeira, veio aparecer no início da década de 40, do séc.XX .
Porém, Mestre Pastinha redesenha o estilo da movimentação de capoeira angola, e diz:
“Com franqueza já é tempo de zelar pelo esporte. O propósito meu não era fazer-me melhor que os camaradas, sim valorizar o  esporte.”
.Este fato mostra que da mesma forma que o Mestre Bimba , Pastinha constrói um estilo que se adequasse ao a perspectiva esportiva, ou seja, a ótica do discurso nacionalista, mas contendo também os discursos identitários da antropologia estrutural. Enquanto, a capoeira das Maltas Cariocas e das brabos de Recife, tem sua perspectiva identitária percebida pela ótica da antropologia cultural.
Mestre Pastinha elaborou um plano de adaptação das características culturais da capoeira baiana a um modelo desportivo, no qual incluiu uma série de categorias comuns às de mais modalidade de lutas e em simultâneo criar um estilo que viesse a ser opor ao estilo regional do Bimba. Apesar desta proposta esportiva, mantém o discurso da raiz africana, mas o entremeia com a perspectiva nacionalista ao apresentar misturas sofridas na estrutura da pureza africana, isto fica claro ao afirmar que o índio contribuiu na estrutura da capoeira praticada no Brasil: “Do índio no quilombo dos Palmares, no contacto com eles nas fazendas de cana, a capoeira ganhou novos golpes, principalmente as defesas, como a negativa a queda para trás, a defesa com as mãos.”
A perspectiva nacionalista é o elemento comum às propostas de modelos de gestualizar a capoeira, tanto Sinhozinho quanto Bimba e Pastinha se enquadravam dentro da questão que moldava a perspectiva política e cultural da época. As diferenças estavam nas perspectivas intelectuais sobre o contexto sócio cultural, que geravam a interpretação sobre a forma do discurso que vestiria o modelo criado.
Na Bahia, ao que parece a capoeira não teve a mesma força do contexto carioca do século XIX, em termos de movimento identitário e em simultâneo a sua característica era muito mais voltada para questão lúdica do que para disputa territoriais grupais. Mas em compensação este fato propiciou redesenhar sua estrutura em novas propostas de gestualidade, que se somam a outro fator, que foi a questão do pinçamento, que o tecido sócio político e cultural do contexto baiano fez da perspectiva da capoeira neste momento.A disputa da maior autenticidade entre o estilo regional e angola e toda indumentária que recheia as proposta ambas, mas precisamente da última, constata a diferença do contexto baiano do universo que a proposta carioca se inseria.

Os discursos, reinvenções de tradição e mitificações que mapeiam a capoeira moderna são heranças desta fase embrionária e constatam o peso do domínio da proposta baiana, que tem uma perspectiva desportiva associada a uma roupagem simbólica. Este fato constata o perfil da capoeira moderna, que é uma proposta criada a partir de um dos segmentos que compunha a estrutura identitária e territorial da capoeira original. Na sua fragmentação, esta foi despida de sua personalidade de movimento social de negação ao estabelecido, que era a sua essência e deixado de lado à espontaneidade da gestualidade de sua comunicação. A qual foi pasteurizada e redesenhada por métodos racionais que foram vestidos pela simbologia dos discursos, mitificações e reinvenções de tradições, para suprir o vazio da identidade perdida.

De todos, o que teve maior repercussão foi o Mestre Bimba, pois devido à organização metodológica de sua luta Regional baiana, teve o suporte político do Estado Novo, que procurava argumentos nacionalistas para disciplinar o corpo dos brasileiros através do esporte e da educação física. Os alunos de Bimba difundiram os ensinamentos de seu Mestre em muitos locais do País, o que proporcionou uma explosão da capoeira como nunca antes. Apesar de não terem nenhuma relação com o passado glorioso das maltas cariocas, esses mestres ajudaram a preservar muitos traços da gestualidade corporal da capoeira através dos tempos.


A Fusão das propostas modernas: O Estilo Regional – Senzala

Até a década de 60, o projeto Regional é hegemônico. Salvador é a terra da Capoeira. Mas, após quase trinta anos depois de sua construção necessitava, para sua difusão de um nicho de grande força difusora; este espaço difusor, neste período, é caracterizado pelas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
No Rio nos inícios dos anos 50, surge o primeiro capoeira baiano, Arthur Emídio. Sua vinda estava relacionada às lutas que nesta época fervilhavam, principalmente as que aconteciam no Maracanãzinho, onde foi derrotado pelo Hermanny (aluno do Sinhozinho), numa luta desafio em 1953.
Mestre Arthur Emidio teve uma grande influência no que é denominado capoeira da zona norte carioca. Baiano de Itabuna chega com movimentos da capoeiragem moderna baiana, que deve ter influências da capoeira de Salvador, provavelmente a de Mestre Bimba. Ficou muito conhecido nesta época, pelas demonstrações, luta de vale tudo, do ensino da arte e de seu estilo vistoso, com saltos e golpes espetaculares.
Com ele chega a indumentária baiana da capoeira moderna ao Rio de Janeiro, o berimbau, o pandeiro e os ritmos e cantos, porém sua movimentação não é tão rica em termos de gestualidade funcional para luta, como a capoeira moderna carioca de Sinhozinho, ficando este movimento restrito à zona norte até a década de 60. Desta época surgem alguns de seus alunos famosos, como o Mestre Leopoldina, Djalma Bandeira e Paulo Gomes e outros.

Porém, sua proposta, apesar das novidades lúdicas, não se mostra a altura da existente no espaço carioca e não vinga e, vai mais tarde se fundir à proposta hegemônica que surgirá na década de 60...


A fase da expansão e massificação da Capoeira no Brasil

Inicialmente, ainda na década de 1960, foi o (carioca) Grupo Senzala no Rio; e os baianos que migraram para São Paulo, como Suassuna e Acordeon (todos nascidos por volta de 1945, e pertencentes à classe média).
A década de 60 é marcada pela simbiose entre as proposta da gestualidade moderna carioca (capoeira de Sinhô) com a baiana (capoeira regional do Mestre Bimba), este processo se dá com o Grupo Senzala, que inicia a fase a expansão e massificação da capoeira no Brasil, juntamente com os baianos que migram para São Paulo,como Suassuna e Acordeon (todos nascido por volta de 1945, e pertencente a classe média.
O período da década de sessenta foi riquíssimo em termos de transformações culturais, no Brasil e no Mundo de uma forma geral. No Rio de janeiro, capital cultural brasileira, surgem os grandes movimentos culturais, como a bossa nova, o cinema novo etc. e é o palco do grande movimento contra-cultural que ocorre no mundo ocidental, sendo particularmente a zona sul, da cidade do Rio de Janeiro, o grande o epicentro desta efervescência cultural.

Neste contexto, surge o grupo Senzala, que é formado por jovens leitores da capoeira de Sinhozinho e alunos iniciantes de Bimba. Este é o grande marco da capoeira moderna, pois ao aglutinar estas duas escolas de movimentação induzida (a Ginástica Nacional carioca e o Projeto Regional baiano), a capoeira toma o impulso da massificação.
O universo vivenciado pelo grupo, no mundo da capoeira moderna, somado as influências do contexto carioca, deu-lhe um grande potencial diferenciador em relação aos demais, a criação de um estilo de movimentação com um design, onde a influência de outras artes marciais, como o caratê que chega com força no universo carioca, mais as influências do contexto cultural vivenciado, serão os elementos que vão propiciar a criação de uma estrutura de movimentação, cuja forma é congelada a um padrão de excelência, que permite o desenvolvimento de um método eficaz, pois seu movimento pasteurizado tem como objetivo clonar o indivíduo ao padrão edificado, perspectiva da ótica moderna globalizante.

O redesenhamento da estrutura metodizada da comunicação gestual, somada a estrutura rítmica padronizada e a característica do contexto envolvido, como de estar localizada na Zona Sul carioca, ser composta principalmente por jovens universitários, desenvolver uma proposta pasteurizada que se combina ao momento cultural (música, movimentos e tradição brasileira), espaço-tempo do movimento contra-cultural. No evento, Berimbau de Ouro, que foi uma competição de estilos de comunicação gestual, do qual o Senzala sai vencedor por três anos consecutivos (1967, 1968, 1969), deu-se o melhor cenário para projetar o Grupo Senzala, como o grande nome da capoeira nacional.
A partir daí, a capoeira toma o rumo Rio /São Paulo e, através deste eixo erradia –se para todo Brasil. Começa pela malha das cidades paulistas e se direciona para as capitais e das capitais paras o interior. Este processo de expansão vai de meados dos anos 70 aos 90 do séc.XX.


A partir da década de oitenta vão surgir os Mega Grupos; as grandes empresas “multinacionais” de capoeira. No Rio, no final da década de oitenta surge, de dissidência do Grupo Senzala, o ABADA; e o Capoeira Brasil.

Nestor Capoeira em Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001), comenta:

"Os "mega-grupos de capoeira": mestres com enorme número de professores e alunos filiados.
Alguns destes mega-grupos - um desenvolvimento das novidades introduzidas por Bimba, na década de 1930, em Salvador, e levadas adiante pela geração regional-senzala, na década de 1960/70, no Rio e São Paulo - já podem ser encarados como grandes "empresas multinacionais de capoeira.
O Abada, de mestre Camisa, é o maior, e o primeiro a apresentar claramente o impressionante perfil de uma "grande empresa multinacional de capoeira", que funciona, além das mensalidades dos alunos e dos "dízimos" dos professores associados, com o suporte de instituições oficiais municipais, estaduais, federais, assim como o suporte de grandes companhias como a Petrobras. "
Neste mesmo período, o estilo Senzala (regional – Senzala) vai influenciar um capoeira Baiano chamado Morais.
Morais, em 01 de abril de 1967 ingressa na Academia do Mestre Pastinha. Seu mestre foi João Grande. Atualmente é Presidente do GCAP - Grupo de Capoeira Angola Pelourinho. Este chega ao Rio, em meados de 1970, servindo na Marinha como fuzileiro naval. Encontra no Rio um ambiente completamente diferente do da Bahia, pois neste período o estilo carioca criado pelo grupo Senzala é o hegemônico, como foi o do Mestre Bimba no período de 30 a 60. Desta forma ele, habilmente, redesenha o estilo angola com base no design do Senzala; é redesenhada a proposta identitária afro-brasileira. Este novo estilo é vestido com o discurso afro americano; surge a “angola mãe”; repete-se a história da construção intelectual de esquerda da década de 30. A diferença é que é um discurso afro em perspectiva globalizada. É importante citar esta perspectiva de discurso no meio da capoeira, pois é ele; que a partir dos anos 80 vai dá condições, ao estilo angola, acompanhar o estilo que faz a massificação da capoeira no Brasil e, já nesta década (1980), inicia sua trajetória fora da sócio fronteira brasileira.

Quando o Movimento Negro re-emergiu, nos 1960s, no Brasil, manifestações afro-brasileiras, como a capoeira, ofereciam uma alternativa aos valores hegemônicos ocidentais e eurocêntricos. Julio Cesar S. Tavares defendeu a primeira tese acadêmica - Arquivo-arma - sobre capoeira, na Universidade de Brasília (1984):
" Houve uma interação entre o Movimento Negro brasileiro e o americano - mais estabelecido e estruturado; a capoeira angola, que estava sofrendo uma revitalização, participou desta dinâmica - capoeira significava uma identidade africana."

Desta forma Morais repete e revitaliza, no Rio, a fase embrionária da capoeira moderna baiana; o discurso intelectual, agora voltado para questão do movimento negro, coloca o estilo angola como o de perspectiva das raízes africanas: o libertário.Porém recheado de mitificações, fundamentos, mitificações e reinvenções de tradição de fora fica o indivíduo e sua perspectiva sócio cultural.
A capoeira moderna, neste período, é reformatada para se adequar a nova ordem do sistema, pois a estrutura baseada na perspectiva baiana original, já não respondia a nova realidade globalizante. Nestor Capooeira em Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001):

"Com o método de ensino, cada vez mais "sofisticado", criado inicialmente pela Senzala carioca e pelos baianos de Sampa (a partir da década de 1960), e que também será utilizado (com as devidas adaptações) pelos angoleiros que voltam a florescer por volta de 1985. Os professores e mestres se adaptavam às necessidades dos shows, e/ou adotavam os novos métodos que faziam sucesso comercial (em termos de número de alunos), e com isso poderiam estar introduzindo deturpações ao espírito do Jogo.
Resumindo: enquanto a capoeira angola e os mestres "tradicionais" perdiam terreno, a nova geração regional-senzala no Rio, em sua maioria vinda da classe média, e os baianos (e outros da própria São Paulo), estava tendo enorme sucesso e fazendo dinheiro."


Michel Maffesoli em “A ética da estética, Papeis avulsos n.3, Rio de Janeiro, CIEC-UFRJ, 1990,” diz que:
" Nesta época dita pós-moderna, existe uma certa "temática da atração" que caminha junto com o corpo; uma "tactilidade contemporânea"; um narcisismo coletivo; uma coisa neo-tribal em que o experimentar junto, o estar junto - onde a estética apareceria como fator de agregação e fortalecimento - é vetor de criação. Neste contexto se enquadraria a popularização do jogging e do cooper, das academias de ginástica e de capoeira. A chamada "malhação" (ginástica, aeróbica, musculação , etc.), p.ex., trabalha uma estética do corpo, "liga social do novo que se esboça, marcado pela falta de engajamento e irresponsabilidade, caracterizando o aparecimento de um homo aestheticus após o homo politicus e homo economicus "
A partir do 1970s, a capoeira é estruturada em um novo perfil; o estilo Senzala. Do eixo Rio/São Paulo, começa a ser exportada para o restante do Brasil, inicialmente para as capitais e delas vetorizadas para o interior dos estados. Neste mesmo período inicia - se, de forma ainda tímida, a ser ensinada na Europa (1971, com Nestor Capoeira) e nos Estados Unidos (1975, com Jelon Vieira e Loremil; 1978, com Acordeon), o estilo predominante era o regional-senzala.

Foi também no início deste período, em 1972, que a capoeira teve entrada na Confederação Brasileira de Pugilismo (CBP), e em 1973 entrou para a Confederação Nacional de Desportos (CND). E rapidamente, em 1974, foi criada a primeira federação de capoeira - a FPC, Federação Paulista de Capoeira -, um "orgão oficial" sob a tutela do CND (Conselho Nacional dos Desportes). Vários dos principais mestres (quase todos baianos) de São Paulo se filiaram.

Nestor Capoeira em Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001), comenta:

"De certa maneira, podemos pensar a adesão destes mestres à Federação Paulista como parte da luta pela hegemonia entre Rio e Sampa.
No Rio, a Senzala se tornava cada vez mais visível com seus 10 "cordas-vermelha" cariocas. Em oposição, a reunião dos baianos de São Paulo, sob o guarda-chuva da FPC, poderia talvez fazer uma oposição "em bloco" mais eficaz e, como as federações eram uma novidade, certamente lançaria a capoeiragem paulista para a frente do palco.
Isto aconteceu até certo ponto pois, em breve, foram criadas federações em outros estados, o que tirou a primazia da FPC. Além disto, a luta interna pelo poder, dentro de cada federação estadual, pulverizou a possibilidade de um efetivo e real "trabalho em bloco".
Finalmente foi criada a CBC - Confederação Brasileira da Capoeira - que coordenaria as Federações Estaduais de Capoeira (uma para cada estado). No início, assim como as federações, teve algum sucesso com a novidade de seu "campeonato brasileiro de capoeira", mas com o passar dos anos, e com a constatação de que o governo não ia derramar rios de dinheiro e benesses nas federações/confederação (nem tampouco entre seus afiliados), este sucesso diminuiu.
No entanto, criou uma nova espécie de divisão: as "associações de capoeira" (as academias filiadas às federações), e os "grupos de capoeira" (academias não filiadas, independentes, muitas das quais tinham adotado um modelo do tipo "regional-senzal"). Mais tarde, com o reflorescimento da capoeira angola, por volta de 1985, muitos angoleiros também ficaram fora das federações. Todo este processo formata mais a capoeira moderna ."

O novo formato da capoeira esportiva (capoeira Moderna) a distancía ainda mais da capoeira identitária e territorial do séc. XIX, pois além da sistematização do método (metodologia Senzala), surge o ordenamento dos espaços capoeiras por processos burocráticos. Um território identitário é construído pela percepção que o indivíduo tem da realidade de seu espaço territorial (território identitário); é uma relação orgânica e não racional, os elementos que vão propiciar, ao indivíduo, esta relação bionômica são os sensores corporais e não normas comportamentais instituídas racionalmente. A incapacidade do indivíduo e corporações de capoeira, de perceberem que a capoeira moderna surge artificialmente e, por conseguinte, sem processo orgânico de territorialização é o grande elemento nutricional da massificação, da capoeira, no Brasil e no exterior. Para tal procedimento surge uma estratégia baseada no vazio de seus discursos, mitificações e reinvenções de tradição. Para o estilo, visto como regional, a indumentária próxima ao desporto era importante o cordel e o abada (calça de capoeira), enquanto o jogador de angola, ênfase no discurso afro brasileiro, mas com a mesma perspectiva de organização da regional, uniforme (calça, camisa e sapatos) com as core criadas pelo grupo. Ambas tem sua comunicação gestual criada por indução, com movimentos facilmente reconhecíveis. Esse movimento, por serem padronizados e congelados numa estrutura estática, não tem interação com relações culturais mais imediatas. Este fato restringe a capoeira a uma ação de movimentos coreografados, para praticas desportivas presa ao ambiente das academias, ou para vestir as mitificações e discursos étnicos, de perspectiva identitária.
Nestor Capooeira em Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001), comenta:

"Por volta de 1975, com a morte de Bimba e o ocaso de Pastinha, a Senzala já era o "acontecimento" mais importante do universo da capoeira. É evidente que isto não era aceito (no discurso) de seus contemporâneos, que eram os mestres e professores da Bahia e de São Paulo (a maioria, baianos) que também estavam tendo muito sucesso em número de alunos, dinheiro e status (dentro da sociedade, em geral). Mas os novos grupos, que começavam a pipocar por todo o Brasil, só tinham olhos para a Senzala.
O centro da capoeiragem tornou-se, repentinamente, o Rio de Janeiro. Para ser mais exato: o Grupo Senzala com seus "cordas-vermelha" que, em 1975, tinham entre 25 e 30 anos de idade. O método de ensino foi, também, evoluindo e ficando mais sofisticado com as contribuições dos "cordas-vermelha" do grupo. Mas, já por volta de 1980, o método de ensino tornou-se rígido demais, e começou a formação de "clones", de "cópias xerox" de jogadores de capoeira que, desde a primeira aula, aprendiam que as coisas, inclusive a ginga que deve ser a expressão da individualidade de cada jogador, deveria ser feita da "maneira certa" (e rígida).
A partir aproximadamente 1980, a violência nas rodas de capoeira, tanto nas rodas de rua quanto dentro das próprias academias, que lentamente já se fazia sentir desde os 1970s, aumentou sensivelmente. Rio e São Paulo foram os centros irradiadores desta tendência.
Os alunos trocavam socos, se agarravam, rolavam pelo chão, chutavam a cara do outro que estava ajoelhado no "pé do berimbau", num descalabro total que não tinha nada a ver com o chamado "jogo duro". "

A violência, no espaço capoeira, observada neste período (1970-1990), tem como fundo a própria realidade da sociedade moderna; a desconsideração do indivíduo na construção de sua própria sócio fronteira. Uma sócio fronteira é construída pelas interações das percepções de indivíduos que em unicidade forma um grupo, uma comunidade. O reordenamento da proposta metodológica da capoeira moderna é feita dentro da perspectiva sócio cultural vigente e, neste período, o Brasil se encontra politicamente dominado por uma ditadura Militar que esta muito bem afinada ao capital internacional e, com isto, ao processo de globalização, que minava e enfraquecia a perspectiva de identidade e territorialidade no espaço brasileiros.
Desta forma a capoeira estrutura sua nova roupagem dentro de uma contexto sócio cultural que apresenta uma grande fragmentação de seus espaços de sócio fronteiras, e absorve a relação de violência dos núcleos urbanos e a interação entre seus componentes vai se dá através da disputa do "mercado" que emerge com força no processo de sua massificação , como jamais houvera antes. A violência seria o resultado direto da comercialização e narcisismo coletivo que se instalou no mundo da capoeira a partir desta fase. Confusos seus personagens, inicialmente, se dedicam a aperfeiçoar a sistematização do método senzala; a única coisa que poderia dentro, da grande homogeneização da capoeira, destacar seu trabalho. E, isto só seria possível nos espaços das rodas de capoeiras. Não existia territórios identitário a serem disputados, pois a capoeira moderna é estruturada em métodos que induzem o indivíduo a se movimentar no espaço, através de leitura racional e não pela leitura de seus sensores corporais, que é orgânica.
Esta violência não deve ser confundida com os combates de rua das gangues de capoeira do séc. XIX. Estas gangues eram compostas por indivíduos de perspectiva identitária e territorial, ou seja; eram cônscios de que eram elementos construtores do contexto sócio cultural, em que viviam;seu território de sustentabilidade vivencial.Suas pendengas eram fruto de interações sócio culturais e não banalidades edificadas em processos midiáticos e capitalista.

Na década de 90, a capoeira se encontra esparramada em todo tecido do espaço nacional brasileiro e, já se espalha pela Europa e pela América do Norte. E seus componentes começam a compreender que a sustentabilidade de um espaço de trabalho não pode apresentar um fenótipo violento e... nesta perspectiva, vão se afastar de qualquer comportamento que venha atrapalhar o perfil da proposta técnica e lúdica construída modernamente.
Nestor Capoeira em Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001), comenta:

"No estrangeiro, os professores (que ensinavam lá) já comentavam que a capoeira/luta - que tinha grande sucesso no Brasil - não funcionava tão bem lá fora; os gringos preferiam algo que destacasse a parte musical e lúdica; o cultural/histórico e a "filosofia"; e que, além de tudo, fosse um espaço de "encontro" com outras pessoas, com saídas para beber e bater papo nos bares depois das aulas - e, desta maneira, combater a solidão assustadora das metrópoles do Primeiro Mundo.
Era necessário aparar as arestas da regional-senzala, e os jovens professores emigrantes assim o fizeram sem descaracterizar a capoeira: deram mais ênfase à música e à parte lúdica, e diminuiram os tipos de treinamento para "viris e combativos" capoeiristas/gladiadores.
Isto, à curto prazo, foi muito positivo para os jovens professores lá fora (atraiu mais alunos); e, a longo prazo, foi muito bom para a capoeira, em geral. Mais tarde, já na década de 1990, quando a capoeira na Europa e USA se tornaram mais fortes dentro do universo da capoeiragem, e começaram a dar sua contribuição e influir no cenário maior, está tendência - mais "jogo", menos "luta" - contribuiu positivamente para o momento, verdadeira Época de Ouro, que a capoeira vive no início do século. "

O estilo angola, vestindo já sua nova roupagem “angola mãe” segue o rastro do estilo que abre o caminho da massificação; regional - Senzala. Nestor Capoeira, em Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001), analisa com muita lucidez esta questão:
"Poderíamos pensar que a Capoeira Angola, que começa a se tornar visível novamente (aproximadamente) em 1985, iria se aproveitar desta característica do mercado americano e europeu, que não se sentia tão atraído pela "estratégia de violência".
Os novos angoleiros desenvolveram um discurso messiânico, dogmático, que lembrava o discurso dos estudantes de esquerda nas universidades brasileiras naquele mesmo período (da ditadura militar de direita), ou então o discurso radical das novas "seitas" cristãs que tanto sucesso fazem hoje em dia (2008).
Os angoleiros se colocavam como a única salvação quando, na verdade, o autoritarismo, a discriminação, a uniformização, grassava tanto, e às vezes até mais, quanto dentro dos círculos regional-senzala.
No entanto só por haver outra opção (embora tão fechada e limitada quanto a anterior), novos ares refrescaram o universo da capoeiragem.
No entanto, a angola não "aconteceu" na Europa como se poderia esperar, provavelmente devido à mentalidade fechada e sectária que veio junto com o renascer da angola: os professores eram "sérios" e exigiam uma "militância", um "engajamento", um "ativismo" (em relação a aspectos "culturais", e/ou "étnicos"), que pareciam ridículos e/ou "estranhos" à maioria dos europeus (alunos de capoeira) que ainda tinham na memória (se não na própria, seguramente na de seus pais e tios) os radicalismo e nacionalismos, de esquerda e direita, de Stalin, Lenin, Mussolini, Hitler, Salazar e Franco. Era uma coisa tão "repelente" quanto a "estratégia de violência.
Depois da criação da "capoeira regional" por mestre Bimba, na Bahia na década de 1930; seguido do grande sucesso do Grupo Senzala, no Rio nos 1960 e 1970s; da capoeira paulista com mestres como Suassuna e Acordeon; e da criação das Federações de Capoeira com seus campeonatos (a Federação Paulista foi a primeira, em 1974) ; parecia que a Capoeira Angola vivia melancolicamente seus últimos dias.
Pouquíssimos mestres da "velha guarda da angola" continuavam em atividade, havia até um ou outro jovem angoleiro ensinando, mas completamente obscurecidos pelo sucesso do novo estilo regional-senzala.
A partir daí, a capoeira, começou a florescer nas capitais brasileiras a capoeira:
- O (então) jovem Helio Tabosa, que tinha convivido e integrado o pessoal da Senzala carioca, já tinha se instalado em Brasília no final da década de 1960. Logo em seguida, aparecem Adilson, Zulú, e muitos outros.
- Neste mesmo final dos 1960s apareceu um incipiente movimento em Belo Horizonte, onde se destacava Cavaliere. Mais tarde, Dunga, uma excêntrica figura de excepcional qualidade entrou em cena. E por volta de 1980 apareceu, no bairro mais chique de B.H., o estruturado grupo Ginga liderado por Macaco, que breve contava com mais de 100 alunos. Na sequência, na década de 1980, Mão Branca (que tinha passado pelo Rio e adotara o modelo Senzala) criou o seu Capoeira Geraes e, aos poucos, tornou-se hegemônico na capital e em todo o Estado de Minas. - Em Curitiba, no início de 1970, temos Vadinho e Eurípedes dando aulas, mas sem grande repercussão. A capoeira só vai explodir com a chegada do (então) jovem Burguês, em 1975, que cria o Grupo Muzenza que irá se tornar hegemônico em todo o sul do país. Burguês tinha sido aluno, no Rio, de Paulão e Mentirinha (por sua vez, aluno de Paraná), mas ao emigrar para Curitiba adotou o modelo regional-senzala.
- Na década de 1970, João Mulatinho, que tinha sido aluno de mestre Gil Velho (Senzala) no Rio, emigrou para Recife. Na década de 1980, dois de seus jovens alunos - Corisco e Birilo - após dar aulas juntos por algum tempo, fundaram seus próprios grupos. Juntos com Teté (que mais tarde emigrou para a Suiça), um talentoso capoeira de rua, que tinha alunos como Barrão (que mais tarde emigrou, e faz enorme sucesso no Canadá), tornaram-se uma referência fortíssima no Nordeste.
Todos estes mestres - Tabosa e Adilson e Zulú (Brasília), Mão Branca (Minas Gerais), Burguês (Curitiba e sul do país), Mulatinho Recife/Olinda, e no Nordeste) -, têm algumas coisas em comum:
- começaram por volta de 1970, e a partir (aproximadamente) de 1985 começam a ter visibilidade no mundo da capoeira;
- tiveram enorme influência e formaram muitos alunos e professores, não só em sua cidade e estado, mas em todo uma região (a partir aprox. de 1990);
- foram fortemente influenciados pelo "modelo Senzala" (estilo de jogo e infra-estrutura do grupo);
- são, quase todos (exceto Tabosa e Adilson, que são um pouco mais velhos), uns 15 anos mais moços (nascidos por volta de 1960/65) que os membros mais atuantes da Senzala como Peixinho, Gato e Gil Velho;
- hoje, continuam como referência no cenário nacional e internacional da capoeira; "


O ressurgimento da Capoeira em Pernambuco

A capoeira Pernambucana do séc. XIX desaparece, como a carioca das Maltas, com o advento da República, ou seja, na última década dos 1800. Traços de sua personalidade são registrados no período da formação das bandas militares(por volta de 1840) e em diversas manifestações sócios culturais, como procissões, pastoris, no   carnaval (nos enfrentamentos entre bandas ou blocos) e outras, como vimos acima. E a partir disto não se vê mais falar de suas gangues territorializando no Recife.
Apesar de não existir uma documentação farta sobre a capoeira em Pernambuco, como os registros existentes no Rio de Janeiro são possíveis fazer uma leitura perceptiva, sobre esta realidade, quando a interpretação, que é feita, tem como base a contextualização do ambiente sócio cultural sobre atores participativos, deste contexto, que não são o objeto foco da pesquisa, mas, por estarem em interação na construção do mesmo, dá visibilidade e, por conseguinte,  registro de participação ao ator foco do estudo. No caso das gangues de Recife do século XIX, são as pesquisas sobre o frevo e sua construção neste contexto que melhor contextualiza sua existência.
Como o texto de F. A. Pereira da Costa (1851-1923), no seu Folk-Lore Pernambucano (1908);

A influência dos desfiles militares, corporações profissionais e procissões religiosas se tornam patente nos cortejos dos clubes carnavalescos (clubes de frevo), desde a disposição das bandas de música, estandartes, símbolos, luxo, heráldica dos distintivos e até cordões de morcegos, lanceiros e mascarados. A importância do capoeira em tais desfiles, particularmente nos idos de 1856, quando existiam no Recife as bandas musicais do 4º Batalhão de Artilharia, chamado popularmente de Quarto, e a do Corpo da Guarda Nacional, esta conhecida por Espanha por ser seu maestro o espanhol Pedro Francisco Garrido. 

O nosso capoeira é antes o moleque de frente de música, em marcha, armado de cacete, e a desafiar os do partido contrário, que aos vivas de uns, e morras de outros, rompe em hostilidade e trava lutas, de que não raro resultam ferimentos, e até mesmo casos fatais!
A capoeira neste período se constituiu um ator de construção do contexto pernambucano, pois juntos as demais manifestações sócios culturais (bandas militares, procissões, clubes carnavalescos etc.), personalizavam este contexto e em simultâneo criavam no tecido urbano da cidade do Recife uma malha reativa composta por nichos de sócio fronteira; unidades espaciais de perspectiva identitária e territorial.  Estas unidades são construídas por sua vez pela perspectiva sensorial corporal do individuo (identidade) sobre seu espaço vivencial (território). Desta forma é a unicidade das percepções dos indivíduos que vão caracterizar o território, seu espaço vivencial e o seu limite é demarcado pela sustentabilidade sócio cultural do grupo; a sócio fronteira.

Nos anos 70 do séc. XX, ela retorna, mas aparece despida de sua personalidade sócio cultural pernambucano. Surge, no Recife, a capoeira esportiva e vem proveniente do Rio de Janeiro através de um adolescente chamado João Ferreira Mulatinho.  Mulatinho, pernambucano, que em 1970 vai para o Rio de Janeiro, acompanhando a família que se muda por motivo de trabalho do pai. No Rio, descobre a capoeira através do Grupo Senzala e entra em contato direto com o grande espaço de informação da capoeira, daquele momento. Mulatinho, com seu perfil esportivo de disciplina marcial, se encaixa perfeitamente no discurso da capoeira de resultado da escola Senzala, que surge, em um período, de convivência de discursos de perspectiva libertária (movimento da contra cultura, movimento ripe, movimentos de guerrilhas de esquerda) com os conceitos ditatoriais imposto pelo processo de ditaduras militares de direita, que varre as Américas apoiadas pelos EUA; ingredientes básicos da massificação da capoeira. Desta forma, Pernambuco como o restante do Brasil, absorve a informação proveniente do eixo Rio/São Paulo e implanta uma proposta metodizada e recheada de ritmos exógenos ao seu contexto sócio cultural.


A fase da implantação da capoeira moderna em Pernambuco 1970 – 1990
O período entre 1970 e 1980 é o espaço tempo da implantação da capoeira moderna em Pernambuco. O Mulatinho , não é o único personagem desta trajetória, existem outros,como Zumbi Bahia e Pirajá, porém é a sua informação  que de fato vai ordena a capoeira em Pernambuco, neste período, pelo simples fato de ser esta informação construída  dentro do estilo hegemônico que massificava a capoeira no espaço brasileiro; o regional-senzala.

Ele constrói esta estrutura durante toda a década de 70 dos 1900s. Inicialmente, vai só durante as férias, onde começa aglutinar pessoas e passar seus conhecimentos, provenientes da sua fase de aprendizagem no Senzala. Durante quase todo a década de 70, como formiga, ele vai tecendo sobre a geografia do grande Recife a forma da capoeira do estilo Senzala  e, no final,  em 1979, retorna  e fixa em Recife organizando,  no espaço do grande Recife, os diversos nichos de capoeira criados sob as influencias de suas informações que foram esparramadas durante o período de suas escaramuças intermitentes neste contesto.

O espaço que vai hospedar a costura final do processo de implantação da capoeira moderna, vestida no estilo regional senzala é a Associação do ex alunos do Colégio Marista. Neste espaço, o Mulatinho junta elementos de classe média e pessoal de rua e então, a partir daí consolida em três anos seu objetivo.

O curto período de implantação da capoeira, pelo Mulatinho, mostra a eficiência do método Senzala em produzir espaço capoeiras através da padronização dos movimentos e, por conseguinte do indivíduo.  Como, também, o perfil dos soldados que vão, a partir das informações do Método Senzala expandir, difundir esta proposta através de enclaves em todo território nacional.
O Mulatinho faz parte do segmento que foi adestrado por um importante nicho de personalidades no mundo da capoeiragem; são os mestres nascidos por volta de 1945.  Em 1990, tinham de 40 a 50 anos de idade e uns 30/35 anos de capoeiragem. Que são os da “geração regional - senzala”.

Esta geração, uns 50 capoeiristas espalhados entre Rio, Salvador, SP, Brasília, EEUU, foi (e ainda é) a que mais movimenta o mundo da capoeiragem. (E se houve “melhorias” ou “deturpações”, a partir de 1965, foi justamente esta geração que introduziu estas mudanças; as gerações que vieram depois - pelo menos até agora, 2008) -, simplesmente seguiram as trilhas e os modelos criados pela regional-senzala.
O perfil sócio-cultural da geração regional-senzala é bem diverso da "velha guarda". Os regionais-senzala, em grande parte, foram formados ou profundamente influenciados pela capoeira regional, criada por mestre Bimba.  Quase 70% são brancos da classe média que tiveram acesso à universidade.  O restante 30%, negros, que coincide com uma origem nas classes economicamente desfavorecidas, também - em sua maioria -, tiveram acesso através da capoeira (contatos e dinheiro das aulas) ao ensino superior.  A Faculdade de Educação Física é a que mais representantes tem, apesar de encontrarmos, praticamente, todas as áreas do ensino acadêmico representadas.

Da mesma forma que a velha guarda, as viagens ao exterior e a todo o Brasil eram (e são) frequentes; o acesso e o convívio com a TV, o cinema, o teatro, a música - e àqueles que pertencem a estes universos -, é fato já integrado, há muitos anos, no dia-a-dia destes capoeiristas. 
Em 1990, havia, talvez, uns 50 destes capoeiristas em atividade.  Mas hoje, apenas uns dez continuam em plena atividade, com uns 60/70 anos de idade. Todos são muito conhecidos.
Os mais velhos, Suassuna e Acordeon. Depois, Gato, Gil Velho, Jelon, Peixinho, Itapuan.

Já, a geração que o Mulatinho vai fazer parte é composta, em sua maioria, por elementos que tem  sua entrada no mundo da capoeira no final da década de 60, dos 1900s. Dentre os mais importantes sita-se; o Camisinha (hoje Mestre Camisa) e o Moraes. Porém vão só participar da dinâmica da expansão da capoeira, a partir dos anos de 1970. Desta forma igual ao Mulatinho não participam da construção da proposta da capoeira que se formata dentro do estilo regional – senzala. Vão ser,  receptores e divulgadores do momento inicial desta proposta, se enquadrando perfeitamente na dinâmica de massificação e vão se destacar ao serem os personagens iniciais das formas que vão vestir a proposta regional - Senzala:  a Ética da estética  da capoeira ("grande empresa multinacional de capoeira" - os mega -  Grupos), Ética da capoeira de identidade afro-brasileira (espaços ordenados a partir de discursos  mitificações, reinvenções de tradição, fundamentado pela ótica americana do movimento negro) e  a  Ética da Capoeira esportiva (integração da capoeira através de Federações).   

Como a grande figura representativa da proposta da ética da estética, como se organiza a maior parte dos espaços capoeiras, temos a figura do Camisinha ou como é hoje conhecido o Mestre Camisa. Camisa vai ser o herdeiro direto do estilo Regional – Senzala. Ele é o que vai neste período 1970 – 1990 ser o vetor principal da massificação deste método no território Nacional. Chega ao Grupo Senzala em 1973, com 17 anos, trazido pelo irmão Camisa Roxa um dos últimos alunos famosos   do Mestre Bimba. Apesar de não apresentar uma capoeira em nível do Grupo Senzala, na época, seu irmão tinha grandes relações com o Grupo e a seu pedido foi aceito. Desta forma entra em contato com este estilo, que se adequou com muita propriedade. Durante seu período de evolução dentro do padrão regional – senzala constrói sua estrutura profissional e 17 anos depois monta sua Mega empresa ABADA.

A proposta da Ética da capoeira de identidade afro-brasileira é elaborada pelo Morais. Morais chega ao Rio no inicio da década de 70 dos 1900s., como fuzileiro Naval e como Camisinha era novo na Capoeiragem. Começa neste Universo em 1967, na academia de Mestre Pastinha. Desta forma suas informações eram bastante limitadas em relação à do padrão carioca, na época, vigente, mas é quem intorduz a idéia do estilo angola no Rio. Instala-se na zona norte e pelo que se sabe, troca muita informação com o Camisinha e destas interações reformula o estilo angola tanto na sua estrutura de movimentação como no seu discurso de perspectiva afro brasileira. A partir daí dá visibilidade e funcionalidade a este estilo, repetindo o período de  1930, anos da gênese da capoeira moderna baiana, onde o discurso intelectual afro brasileiro veste a proposta, nua de perspectiva identitária afro, do Mestre Bimba, com uma grande diferença da anterior, pois isto não se passa mais em Salvador, mas no Rio de janeiro.  Morais, cria a “angola mãe” e em simultâneo a possibilidade de ter um enclave de pseuda personalidade afro, ordenado no  discurso  do movimento negro americano, para participar no grande mercado que a capoeira abre neste momento.


A Ética da Capoeira esportiva
é um dos segmentos que também participa desta fase de vetorização do estilo regional Senzala e, seu principal personagem fora do eixo Rio São Paulo é o Mulatinho. Mulatinho, apesar de ser bem mais moço do que seus dois companheiros citado acima, vai ser a grande referencia, desta perspectiva, nesta época. Dentre os três citados, o Camisinha é que se aproxima mais de sua personalidade. O Morais é, dos três, o  que se mostra mais perceptivo, ou seja; sua trajetória  tem um discurso sofisticado, o que indica que sua elaboração é fruto de uma percepção sobre a realidade que o cerca. Já o do Mulatinho e do Camisinha o discurso é o que o sistema lhe oferece para ler; eles , simplesmente vão repeti-lo. O sucesso entre eles ( Camisinha e Mulatinho) vai estar no tipo de  opção do rumo a caminhar, ou seja; dependera do caminho que optaram e que vão caminhar em rumo cego e este sucesso dependerá se a escolhida vai acompanhar a volatilidade do sistema globalizante.

O Mulatinho é como muitos desta época, moldado em um ambiente burguês, onde o lema da classe média é não pensar e seguir regras estabelecidas no sistema e ... nunca confronta – las. Sua idéia se aproxima muito da do Sinhozinho; uma mentalidade voltada para o desporto, ele, como Sinhozinho, ensinou capoeira, boxe e luta Livre a seus alunos. No Boxe, produziu um destacado lutador; o Todo Duro. Foi um defensor ferrenho da organização da capoeira dentro de uma estrutura de federação desportiva. E foi o que se estruturou em Pernambuco e prematuramente sedimentou – se.
Nestor capoeira, com muita propriedade analisa, o colocado em Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001):
"Foi, no início dos 1970, em 1972, que a capoeira teve entrada na Confederação Brasileira de Pugilismo (CBP), e em 1973 entrou para a Confederação Nacional de Desportos (CND).  E rapidamente, em 1974, foi criada a primeira federação de capoeira - a FPC, Federação Paulista de Capoeira -, um "órgão oficial" sob a tutela do CND (Conselho Nacional dos Desportes).  Vários dos principais mestres (quase todos baianos) de São Paulo se filiaram.

De certa maneira, podemos pensar a adesão destes mestres à Federação Paulista como parte da luta pela hegemonia entre Rio e Sampa.
No Rio, a Senzala se tornava cada vez mais visível com seus 10 "cordas-vermelha" cariocas. Em oposição, a reunião dos baianos de São Paulo, sob o guarda-chuva da FPC, poderia talvez fazer uma oposição "em bloco" mais eficaz e, como as federações eram uma novidade, certamente lançaria a capoeiragem paulista para a frente do  palco.
Isto aconteceu até certo ponto pois, em breve, foram criadas federações em outros estados, o que tirou a primazia da FPC. Além disto, as lutas internas pelo poder, dentro  de cada federação estadual, pulverizou a possibilidade de um efetivo e real "trabalho em bloco".
Finalmente foi criada a CBC - Confederação Brasileira da Capoeira - que coordenaria as Federações Estaduais de Capoeira (uma para cada estado). No início, assim como  as federações, teve algum sucesso com a novidade de seu "campeonato brasileiro de capoeira", mas com o passar dos anos, e com a constatação de que o governo não  ia derramar rios de dinheiro e benesses nas federações/confederação (nem tampouco  entre seus afiliados), este sucesso diminuiu.
No entanto, criou uma nova espécie de divisão: as "associações de capoeira" (as academias filiadas às federações), e os "grupos de capoeira" (academias não filiadas, independentes, muitas das quais tinham adotado um modelo do tipo "regional-senzal").  Mais tarde, com o reflorescimento da capoeira angola, por volta de 1985, muitos angoleiros também ficaram fora das federações.
As Federações, e a Confederação, muitas vezes, e especialmente no início, assumiram uma atitude extremamente autoritária e arrogante. Era como  se dissessem: "agora vamos mostrar a estes ignorantes e desorganizados capoeiristas como se gerencia uma atividade ". No entanto, a maioria dos dirigentes das Federações não eram estranhos à capoeira, como se poderia pensar devido à sua atitude; eles eram capoeiristas. Alguns eram mestres respeitados; outros eram uns caras de quem ninguém jamais tinha ouvido falar, uns burocratazinhos que não tinham conseguido se fazer na capoeira e agora viam a sua chance de exercer algum poder.

Enviavam cartas aos locais onde mestres não-filiados ensinavam, ameaçando os locadores com represálias. Uma vez que o mestre, que estava alugando o local, era "ilegal". Telefonavam e mandavam cartas aos teatros onde houvesse um espetáculo de capoeira com o mesmo tipo de ameaça. Tudo  com uma linguagem "oficial", "de advogado", e, nas entrelinhas, a atitude de quem "pertence"  ao grupo militar que dominava o país. Era assustador, uma vez que a ditadura militar, de 1964-1984, sumia com seus desafetos, e recorria à tortura e ao assassinato.
Com o passar do tempo, e vendo que muitos mestres de renome não se intimidavam, alguns dirigentes assumiram uma postura mais inteligente e flexível; mas eram uma exceção.

No entanto, as Federações, com seu ranço de autoritarismo do tempo  da ditadura militar, nunca tiveram o sucesso que almejaram.
Mestre Luiz Renato, citado por Mathias Assunção, também defende esta tese - da pouca influência das federações - quando diz que "ficou claro  que os grupos foram a modalidade de organização que a capoeira escolheu (em oposição às 'associações' filiadas às Federações)" (VIEIRA, L.R. Praticando Capoeira, SP, ano 2 nº 17, p.33).
O colocado acima mostra muito bem em que universo o Mulatinho foi formatado e em sua oportunidade de mostrar seu aprendizado racional, ele o coloca como um soldado exemplar. E, como qualquer soldado, sem percepção do impacto que faz no contexto sócio cultural que se situa implanta uma proposta, de capoeira, sem considerar a realidade de um espaço de forte resistência na manutenção de sua rica diversidade sócio cultural.
O mulatinho, Camisinha e de certa forma o próprio Morais, foram presas do que surge neste período. E, Nestor Capoeira, mais uma vez complementa minha percepção, em seu Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001):
No entanto, não foi só o "estilo de jogo" que influenciou toda a capoeiragem daquela época, especialmente as gerações mais novas. E também não foi só o "método de ensino", que começou a ser copiado. Foi também toda uma infra-estrutura e uma "mentalidade".
Uma infra-estrutura com os "uniformes", a graduação através "cordas" de cor diferente na cintura (influência do judô e karate),estrutura das aulas (aquecimento, "malhação", treinos e roda) e também os discursos de perspectivas étnicos, organizados desta mesma forma etc..... a ”invisibilidade das mudanças, táticas, dos desconectados, das artimanhas do processo de globalização”.
A fase da implantação da capoeira moderna em Pernambuco foi meteórica. Seu ápice foi o período compreendido entre 1979 a 1982. Neste espaço tempo, Mulatinho  implanta e formata seu projeto, tanto a nível de arte marcial, como  de estrutura de controle deste espaço, através da criação de uma estrutura federativa de capoeira dentro da Federação de pugilismo de Pernambuco. Por isto é que nunca se preocupou em se organizar  através de um grupo, apesar de ter toda os condicionantes para formar um mega grupo, através de seu Grupo Malê. Em 1983 o seu espaço capoeira é fragmentado em diversos nichos grupais, porém todos ficam atrelados ao Mulatinho através da Federação que ditará as normas comportamentais destes espaços. A Federação,  forma os  Mestres que por sua vez tem seus grupos. Estes grupos são estruturados dentro das normas da Federação. Desta forma a federação tem o controle do espaço capoeira, que é formado pelos grupos.
Em 1982, Mulatinho, em uma entrevista para o Diário de Pernambuco traduz, com clareza, o perfil da proposta de capoeira que estava se estruturando naquele momento.

“Comecei meu trabalho com os capoeiristas que já existiam aqui, como os dos Prazeres e ensinei lhes todas as sequencias dessa luta, que hoje também é um esporte e uma cultura popular” – conta Mulatinho - lembrando o princípio de tudo, em 1979, na praia da Piedade;só no ano seguinte que o grupo Malê transferiu-se  para Associação dos Antigos Alunos do Colégio Marista. E foi com estes primeiros alunos que Mulatinho  introduziu, no Recife, as verdadeiras técnicas da capoeira (regional – senzala) , tais como indumentária, o sistema de graduação (sistemas hierárquicos da capoeira, onde os cordéis  amarrados a cintura possuem sete cores diferentes, formando as sete linhas da umbanda, correlacionados com as setes fases sociais do negro, desde do dia que ele chegou aqui, até os atuais).

Com estes alunos formados foi possível difundir a capoeira, em Pernambuco, com rodas de rua,apresentação em televisão, teatro e também criando novos grupos de capoeira. Hoje o Grupo Malê esta ampliado com uma média de oitocentos capoeirista, desde os iniciados, graduados e muitos que ainda estão iniciando. ”Hoje em dia – ressalta Mulatinho – a capoeira é um esporte, uma arte, onde se canta, se toca, se expressa corporalmente e se luta.

Como esporte e luta a capoeira é regida por seus órgãos competentes. No Brasil, a Confederação de Pugilismo e, nos Estados, através das Federações de Pugilismo, que intessificam as competições . No Recife elas são realizadas no Ginásio do SESC e são controladas por regulamentos próprios. No tocante a rua são enfatizadas as rodas de rua, que tem característica próprias, podendo ser usados todos os artifícios da capoeira . Desde dedos nos olhos até golpes fatais. Uma outra modalidade de capoeira – explica Mulatinho -  é a de salão isto é praticada nas academias, onde o capoeirista prima pela coreografia, pela estilização. É aí que o capoeirista expressa todo o potencial visual - artístico  da capoeira.

Indagado sobre o atual estágio da capoeira em Pernambuco, que só este ano, em abril, foi realizado o primeiro seminário Norte e Nordeste de Capoeira, com a participação dos Estados do Maranhão, Ceará, Paraíba, Pernambuco e Bahia. Houve, também, a Taça Mestre Mosquito de Capoeira, onde cada estado fez se representar com três atletas. Pernambuco conseguiu os três primeiros lugares.No mês passado, aconteceu o segundo seminário Norte – Nordeste e a Copa Leonina de Capoeira, com a participação dos Estados do Maranhão, Pernambuco,Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba,Bahia e Acre. A copa foi disputada entre Pernambuco e Bahia( que não aceitava a derrota de abril): Pernambuco ganhou por 5 a 3.

Os projetos futuros de Mulatinho e seu Grupo Malê residem na formação de uma boa equipe, apta a desenvolver projetos esportivos  e de preservação da cultura popular, ”Por isto queremos difundir a capoeira nos centros sociais  Urbanos e nas escolas da rede oficial, bem como nas sociedades esportivas.  Queremos a massificar um pouco  a capoeira, tira-la  das academias, que são mais fechadas e não acessíveis a todos. Com esta massificação queremos preservar como cultura popular”. ( Capoeira: dos quilombos para os salões, caminho de uma arte - Diário de Pernambuco, caderno Viver/ Seção B, Pagina 1  – 23/09/1982)

Em 1984, ocorre o primeiro fórum de Capoeira, da fase Regional – Senzala, o Encontro Nacional da Arte Capoeira realizado no Circo Voador, no Rio. Este encontro teve a participação direta de 64 capoeiristas de bom nível técnico, e vindos de 8 estados diferentes, era algo bem impressionante. Mulatinho vem representando Pernambuco e coroa seu trabalho ao  apresentar seus alunos que no conjunto se iguala aos de melhores níveis técnico para época. Ao mesmo tempo é o defensor da capoeira organizada federativamente.

Nestor Capoeira, que registrou este evento descreve, em seu Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001
"Planejado e dirigido por Camisa (que pertencia ao) e pelo Grupo Senzala, "núcleo irradiador" dos novos rumos tele-reais da capoeira; com o suporte do Circo Voador, uma casa de espetáculos de sucesso no Rio; do departamento de Dança do INACEN (Instituto Nacional de Artes Cênicas) - diferente do patrocínio da FAB, em 1969, e do quartel de Campo dos Afonsos como cenário -; contou com a presença de 64 capoeiristas vindos de oito estados diferentes: Bahia, São Paulo, Brasília, Minas Gerais, Espírito Santo, Pernambuco, Ceará e Rio.
Entre estes, as figuras mais conhecidas e atuantes do mundo da capoeiragem incluindo a "velha guarda de Salvador", tais como Valdemar da Paixão, João Pequeno, Canjiquinha, Atanilo.
 Neste Encontro, de 1984, não se pretendia - em oposição ao que acontecera em 1969 - impor, nem votar, nem regulamentar nada: era um "encontro de capoeiristas visando trocar idéias e experiências". 
Eis alguns dados que confirmam a tendência de uma mudança radical no panorama da capoeiragem:
 - quatro entre as oito palestras tinham por objetivo o histórico longínquo ou recente, tentando situar o momento presente e redirecionar os rumos de acordo com a herança do passado;
 - uma outra palestra discutia "a ciência e a arte na capoeira", concluindo que "a ciência poderia dar sua contribuição, mas deve apenas assessorar sem dominar ou restringir a arte";
- outra palestra enfocava as Federações de Capoeira e ficou evidente que a "capoeira-esporte" tinha perdido muito terreno;
- finalmente, a "descaracterização e preservação da capoeira", espécie de mea culpa da geração senzala que tinha organizado o Encontro;
- e o "bate-papo com a velha-guarda", legitimando e dando status à velha guarda. "

A partir de 84, o universo da capoeira, em Pernambuco, apresenta o mesmo comportamento dos espaços em que surge nesta fase; se erradia da capital (o grande Recife), para o interior.  Sendo que ao fragmentar seu núcleo, composto por elementos de vários segmentos sociais  aglutinados em discurso de estrutura esportiva e não de interatividade sócio cultural, Mulatinho cria unidades de espaços capoeiras que disputam entre si o domínio da melhor técnica e com isto, estes espaços vão interagir entre si com pendengas violentas.
"Com estes alunos formados foi possível difundir a capoeira, em Pernambuco, com rodas de rua,apresentação em televisão, teatro e também criando novos grupos de capoeira. Hoje o Grupo Malê esta ampliado com uma média de oitocentos capoeirista, desde os iniciados, graduados e muitos que ainda estão iniciando. ”Hoje em dia – ressalta Mulatinho – a capoeira é um esporte, uma arte, onde se canta, se toca, se expressa corporalmente e se luta."
 (Entrevista do Mulatinho ao Diário de Pernambuco, caderno Viver/ Seção B, Pagina 1  – 23/09/1982)

O espaço do grande Recife é um dos mais violentos do país por razões de distorções sócio econômicas que minam a identidade e, por conseguinte a noção de territorialidade do indivíduo. A capoeira imposta pelo Mulatinho só vem acirrar esta perspectiva, pois explora a competitividade individual e não a busca da inclusão social.
"No tocante a rua são enfatizadas as rodas de rua, que tem característica próprias, podendo ser usados todos os artifícios da capoeira. Desde dedos nos olhos até golpes fatais. Uma outra modalidade de capoeira – explica Mulatinho -  é a de salão isto é praticada nas academias, onde o capoeirista prima pela coreografia, pela estilização. É aí que o capoeirista expressa todo o potencial visual - artístico  da capoeira."
 (Entrevista do Mulatinho ao Diário de Pernambuco, caderno Viver/ Seção B, Pagina 1  – 23/09/1982)

 Este é o grande problema do discurso das Federações é como, a exemplo, das grandes potencias, que trocaram o colonialismo pelo neo - colonialismo; Colonialismo é uma interferência  direta sobre um território nacional,ou seja, o colonizador esta diretamente ordenando o espaço segundo suas intenções exploratórias. Já no neo-colonialismo, o colonizador está indiretamente envolvido; administração é feita por uma elite pátria subjugada pelo dominador. Ele estará sempre no controle desta elite ou sobre possíveis disputas internas. Ele sempre será o conciliador, mas esta posição só será mantida se, em simultâneo, estiver criando condições instabilidade, da não interatividade entre os grupos e indivíduos deste universo. Foi o que aconteceu, na gênese do espaço capoeira atual,  em Pernambuco. Mulatinho, em optar pela criação de uma estrutura federativa deixou de intervir diretamente sobre o espaço que cria; o grupo. Desta forma permite sua fragmentação em diversos espaços agrupados em um de seus discípulos direto e com isto, tem uma ingerência indireta de suas regras e poder. Evitando assim a perda deste poder prematuramente sobre o universo da capoeira local.  O discurso por ele introduzido por ser vazio, limitado, ou seja, ilusório produziria,  mais cedo o mais tarde, o mesmo; todos grupos vão gradativamente se desmembrando em outros por não ter uma perspectiva de unicidade com base em identidade e territorialidade.
"Como esporte e luta a capoeira é regida por seus órgãos competentes. No Brasil, a Confederação de Pugilismo e, nos Estados, através das Federações de Pugilismo, que intessificam as competições. No Recife elas são realizadas no Ginásio do SESC e são controladas por regulamentos próprios."
 (Entrevista do Mulatinho ao Diário de Pernambuco, caderno Viver/ Seção B, Pagina 1  – 23/09/1982)
Recorrendo ao Nestor Capoeira, em seu Jogo de Corpo e Comunicultura" (ECO-UFRJ, 2001
"As Federações, e a Confederação, muitas vezes, e especialmente no início, assumiram uma atitude extremamente autoritária e arrogante. Era como  se dissessem: "agora vamos mostrar a estes ignorantes e desorganizados capoeiristas como se gerencia uma atividade ". No entanto, a maioria dos dirigentes das Federações não eram estranhos à capoeira, como se poderia pensar devido à sua atitude; eles eram capoeiristas. Alguns eram mestres respeitados; outros eram uns caras de quem ninguém jamais tinha ouvido falar, uns burocratazinhos que não tinham conseguido se fazer na capoeira e agora viam a sua chance de exercer algum poder.

Enviavam cartas aos locais onde mestres não-filiados ensinavam, ameaçando os locadores com represálias. uma vez que o mestre, que estava alugando o local, era "ilegal". Telefonavam e mandavam cartas aos teatros onde houvesse um espetáculo de capoeira com o mesmo tipo de ameaça. Tudo  com uma linguagem "oficial", "de advogado", e, nas entrelinhas, a atitude de quem "pertence"  ao grupo militar que dominava o país. Era assustador, uma vez que a ditadura militar, de 1964-1984, sumia com seus desafetos, e recorria à tortura e ao assassinato.

Com o passar do tempo, e vendo que muitos mestres de renome não se intimidavam, alguns dirigentes assumiram uma postura mais inteligente e flexível; mas eram uma exceção.
No entanto, as Federações, com seu ranço de autoritarismo do tempo  da ditadura militar, nunca tiveram o sucesso que almejaram.

Mestre Luiz Renato, citado por Mathias Assunção, também defende esta tese - da pouca influência das federações - quando diz que "ficou claro  que os grupos foram a modalidade de organização que a capoeira escolheu (em oposição às 'associações' filiadas às Federações)". (VIEIRA, L.R. Praticando Capoeira, SP, ano 2 nº 17, p.33).

A partir daí, o espaço pernambucano de capoeira vai se comportar como todos que absorveram esta proposta; um distanciamento grande da realidade do contexto sócio cultural  e a tentativa de cobrir esta perspectiva aumentando o grau de  sistematização da metodologia proposta, através associação de técnicas  provenientes de outras propostas de artes marciais e a sofisticação do discurso construído da sua origem afro brasileira que inclui novas linguagens, de tradição, de mitificações, de fundamentos  e, tudo direcionado para dá a esta capoeira o status de instrumento sócio cultural.
 
"Os projetos futuros de Mulatinho e seu Grupo Malê residem na formação de uma boa equipe, apta a desenvolver projetos esportivos  e de preservação da cultura popular.”Por isto queremos difundir a capoeira nos centros sociais  Urbanos e nas escolas da rede oficial, bem como nas sociedades esportivas.  Queremos  massificar um pouco  a capoeira, tira-la  das academias, que são mais fechadas e não acessíveis a todos. Com esta massificação queremos preservar como cultura popular."
(Entrevista do Mulatinho ao Diário de Pernambuco, caderno Viver/ Seção B, Pagina 1  – 23/09/1982)

3.3.1.2.2 – A realidade da capoeira de perspectiva exógena sócio culturalmente no contexto  pernambucano.

Na década de 90 (1990), o contexto pernambucano encontra-se com todas as propostas que moldou a capoeira na fase regional Senzala (Ética da estética  da capoeira, Ética da capoeira de identidade afro-brasileira ,Ética da Capoeira esportiva), apesar de ser o hegemônico o da ética da capoeira esportiva, pois a capoeira entra, no espaço pernambucano, já sendo formatada numa estrutura de entidade Federativa (Federação). Este é a razão do não desenvolvimento de grupos  fortes ligados a proposta da ética da estética. Os grupos que vão se fazer presentes, nesta perspectiva ou foram formados a partir de um indivíduo, com trabalho desenvolvido no exterior, ou por indivíduos que migraram e criaram espaços  de trabalho fora , mantendo-se ligado a seu grupo de origem e que se ordenam, a partir da ótica referencial de legitimação do seu produto vendido(sua proposta de capoeira) com o universo sócio cultural brasileiro. Neste período, é que entra a proposta da ética da capoeira de identidade afro brasileira e em simultâneo começa o declínio da proposta da capoeira sobre o espaço Pernambucano. Este é um fenômeno que ocorre em todo espaço brasileiro, nesta década; a força inicial de expansão da fronteira da capoeira perde sua força e este espaço retrai. E isto se dá, sobre todos os espaços de capoeira independente de seu discurso e em simultâneo a isto, a proposta da capoeira migra para além da fronteira nacional e, exatamente neste período, começa a se massificar no exterior, principalmente para os paises do Leste Europeu e Estados Unidos.

A explicação para este fato esta na relação do discurso, da Capoeira atual, ornamentado por fragmentos da cultura brasileira e a realidade sócio cultural do contexto em que ela se inseri. O que provoca retração  do espaço massivo da capoeira.

No caso Pernambucano, espaço de grande diversidade sócio cultural, a capoeira encontra uma grande resistência, pois ela com sua proposta de movimentação metodizada associadas a ritmos padronizados, se confronta com um universo altamente rico na perspectiva simbiótica entre movimento e ritmo, que sua proposta não consegue suplantar. Outro elemento forte na explicação deste declínio esta na diminuição da participação do segmento da classe média no contexto da capoeira, principalmente dos espaços de proposta da ética da estética, vetor principal da massificação da capoeira.